Muitas coisas na vida a gente sabe como começam, mas não imagina como vão terminar. Manifestação popular, contra ou a favor, é um exemplo disso. Há dezenas, centenas de outros, mas as manifestações são o assunto que nos interessa agora pois é de uma em especial que o presidente Bolsonaro anda cuidando, assumindo, já mais abertamente, o risco de convocá-la.
Afinal, o que deseja o presidente ao pedir ao povo que vá para as ruas em defesa de seus interesses que, afinal, ele não explica bem quais são? Este é, claramente, um dos chamados “atos inúteis” de que falam os políticos mais experientes, com a recomendação de que não devem ser cometidos.
Bolsonaro teve 57 milhões de votos no segundo turno da disputa eleitoral contra o PT. Quantas pessoas ele terá que colocar nas ruas agora para provar que não se elegeu apenas com os votos dos contrários ao PT, mas que, ao contrário, vai se transformando numa liderança real, capaz de conduzir o país para a sua recuperação? E se a adesão ao seu chamamento for pequena, algo perfeitamente possível em tempos de coronavírus, o que ele fará?
Não há lógica política em se convocar uma manifestação dessa, bem ao estilo de Maduro e outros ditadores populistas de esquerda. O Brasil já caminha, e a passos bem largos, para uma radicalização política sem precedentes, com a agravante de que não temos lideranças capazes de conduzir um processo de pacificação caso o país chegue a uma situação extrema.
Há setores da sociedade que, de forma até irresponsável, buscam desmoralizar as instituições – Legislativo e Judiciário mais precisamente – sem medir as consequências de seus atos. Claro que são Poderes com muitos defeitos, com baixa qualificação, mas é bom lembrar que seus membros, em especial no caso do Legislativo, possuem a mesma legitimidade que tem o presidente e, nos Estados, os governadores. Foram eleitos pelo povo.
Culpar o Legislativo e o Judiciário pelos problemas do país é falsear a verdade. Culpados são todos os que têm a responsabilidade de gerir o país. Culpados somos todos nós que escolhemos mal nossos representantes e governantes. Radicalizar e desmoralizar instituições não vai resolver nossos problemas. Ao contrário, a experiência mostra que pode complicá-los.
Num momento de insensatez política, a esperança de equilíbrio fica na ação dos governadores. Serão eles os responsáveis pelo controle da situação de forma a evitar que as manifestações gerem conflitos entre os prós e os contra, seja lá o que for o que defendem os organizadores da manifestação. Nos últimos meses, os governadores, alguns com mais ênfase, têm buscado convergência em ações que visam à retomada da economia e à superação dos verdadeiros dramas sociais resultantes do desemprego e da falta de investimentos em saúde, saneamento, educação e infraestrutura.
Já demonstraram unidade política ao se posicionarem contrários ao presidente na questão da redução do ICMS sobre combustíveis. Têm agora a oportunidade de agir politicamente em defesa da democracia.