Os dois anos de mandatos coincidentes entre Jair Bolsonaro e Donald Trump estão registrados na história das relações exteriores brasileiras como um dos períodos de mais evidente alinhamento entre a política brasileira e os interesses de Washington. No passado, momentos assim foram poucos e ficaram restritos a breves intervalos do século XX: isso ocorre porque, na divisão ideológica nacional entre esquerda e direita, o mais comum é que ambos sejam refratários aos planos que a nação ianque desenha para o Brasil. A busca por um lugar de destaque próprio no mundo vem sendo a postura que predomina na política externa nacional.
De 2019 a 2020, contrariando a tradição, Bolsonaro seguiu os EUA até em situações prosaicas: comemorar o feriado ianque de 4 de julho e prestar continência à bandeira dos EUA, por exemplo, só mostrou subserviência. Já abdicar do status de país em desenvolvimento junto à Organização Mundial do Comércio, algo benéfico ao setor agrícola nacional, só favoreceu interesses dos Estados Unidos.
A polêmica em torno do alinhamento aos EUA, entretanto, pode ter chegado ao fim. Joe Biden, em menos de seis meses de mandato como presidente, alterou o curso de ação dos EUA de forma tão radical que hoje seria recomendável que Bolsonaro o copiasse em detalhe.
A principal novidade na cartilha ianque é a edição de um pacote de recuperação econômica, orçado em incríveis US$ 6 trilhões. Parte do valor será destinada ao custeio de um auxílio emergencial às vítimas da crise econômica gerada pela pandemia, que inclui até o pagamento de aluguéis para conter a onda de despejos que assola os EUA. Cerca de US$ 1,8 trilhão terão esse fim, e o Congresso já autorizou a despesa.
A maior parte do programa, entretanto, constitui o exemplo mais valioso: será financiado um vigoroso plano de obras de infraestrutura, promessa da campanha de Trump que não foi executada, assim como um inédito plano de incentivo à transição da economia dos EUA para uma matriz energética renovável.
O chamado “New Deal verde” se inspira no plano econômico desenvolvido por Franklin D. Roosevelt em meados da década de 1930, responsável por retirar o país da chamada “grande depressão”. Na época, investimentos públicos em larga escala reativaram a atividade econômica e, ao mesmo tempo, construíram uma vasta rede de energia e transportes, que viabilizou o crescimento nas décadas seguintes.
Ao retomar esse tipo de pacto nacional de larga escala, agora direcionado para adequar a economia norte-americana para os paradigmas ambientais e de competitividade do século XXI, Biden não apenas contribui para a superação dos efeitos da pandemia, como também prepara os EUA para mais cem anos de crescimento econômico.
Agora o bom exemplo está posto: chegou a hora de imitar os ianques e investir decididamente na infraestrutura da nova economia verde – fiel da balança que diferenciará países ricos e pobres no futuro próximo.