PAULO DINIZ

Guerra de narrativas inevitável

Os efeitos das redes sociais sobre a política são comentados com frequência nesta coluna, sendo a demanda por respostas cada vez mais rápidas o que se percebe mais facilmente

Por Paulo Diniz
Publicado em 30 de janeiro de 2024 | 06:00
 
 
 
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Os efeitos das redes sociais sobre a política são comentados com frequência nesta coluna, sendo a demanda por respostas cada vez mais rápidas o que se percebe mais facilmente. Porém, a constante guerra de narrativas entre grupos políticos é outro desses efeitos, buscando constantemente legitimar os “heróis e os vilões” da política brasileira a partir de argumentações que são reproduzidas milhões de vezes – tanto nos ambientes virtuais quanto nas relações pessoais.

Um exemplo recente e bastante didático dessa guerra de narrativas foi a cerimônia organizada pelo governo federal para marcar o primeiro aniversário da rebelião bolsonarista de 8 de janeiro de 2023.

De início, percebe-se que o grandioso evento governista não se tornou o fato histórico marcante que seus organizadores desejavam. É fato que tudo aquilo que a máquina de comunicação do Planalto deseja divulgar sempre acaba ganhando algumas manchetes. Porém, nem de longe foi obtido o impacto histórico desejado pelo governo. Em vez de rivalizar com os acontecimentos do ano passado no imaginário coletivo e nas redes sociais, o evento do governo logrou mesmo reavivar as imagens barbáricas de janeiro de 2023 no centro cívico dos Poderes federais.

Por definição, qualquer movimento de massas é mais marcante do que uma cerimônia oficial detalhadamente planejada. Sendo assim, desde a concepção, o evento denominado “Democracia inabalada” já havia falhado no objetivo de mercar corações e mentes dos brasileiros.

Para além de avaliar o impacto da estratégia governista, entretanto, vale refletir sobre o fato de que essa se encontra no âmbito de uma batalha de narrativas que não poderia, simplesmente, ser deixada de lado pelo campo governista.
Assim, mesmo se lançando em uma tarefa quase impossível de ser vencida, o campo governista não tinha outra opção, senão a de lutar nessa batalha midiática. Caso não apresentasse sua versão da história, devidamente marcada por celebrações públicas grandiosas, o governo deixaria a população que o apoia sem argumentos que a validassem nesse posicionamento político. Abster-se, na guerra de narrativas, equivale a perdê-la.

Prova de que a ausência equivale à derrota antecipada foi o comportamento da oposição: simultaneamente ao evento do governo, sua contraofensiva foi lançada. Deixando de lado a natureza golpista dos eventos de janeiro de 2023, os porta-vozes da direita condenaram os governistas pelo suposto uso político do ato de repúdio à rebelião bolsonarista. Trata-se, portanto, de um protesto da oposição contra o protesto do governo, que, por sua vez, se voltava contra um protesto anterior, realizado pela oposição.

Não é fácil entender e menos ainda se engajar nessa disputa de narrativas que cada vez mais se afasta da realidade concreta. Porém, o preço da abstenção é a concessão da vitória – que, antes de ser política, é moral – ao oponente, com efeitos que se tornam mais impactantes com o tempo. Ao fim e ao cabo, todos esses discursos deságuam nas urnas – onde ninguém quer sair derrotado.

 

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