Quem escreve sobre política, sobretudo quando se arrisca a falar do futuro, acumula erros e acertos. O passar dos anos se encarrega de mostrar qual dos dois predomina: mesmo sem construir uma estatística oficial, acredito ter um saldo positivo nas previsões que faço nas páginas de O TEMPO desde 2011 – quando foi publicado meu primeiro artigo.
Um exemplo que vem à memória data de abril de 2015, quando analisei a postura do PSDB como o principal partido de oposição no Brasil. Os fenômenos da nova direita e de Jair Bolsonaro não faziam parte do radar político de ninguém, porém chamava a atenção a discrepância entre a expressiva votação que os candidatos tucanos exibiam em eleições presidenciais e a atuação anêmica do PSDB como força política em períodos não eleitorais.
Como a insatisfação com os governos petistas atingia níveis históricos em 2015, os tucanos se comportavam como irmãos que esperam por uma rica herança, que inevitavelmente viria até eles sem que nada precisasse ser feito. Porém, o poder – diferentemente das heranças – não chega até quem não se esforça: e foi do alto de 4,76% dos votos na disputa presidencial de 2018 que o PSDB conheceu essa nova realidade – superado por Bolsonaro e por Ciro Gomes, que souberam atrair os insatisfeitos à direita e à esquerda.
A julgar pela movimentação recente das lideranças do partido, a lição não foi aprendida. Autodeclarado como principal liderança tucana nacional, João Doria confunde a promoção do próprio nome com a tradicional empáfia paulista, cobrindo a si mesmo de superlativos e esperando do resto do país nada menos do que aplausos extasiados. Não por acaso, os principais rivais de Doria nas prévias do PSDB são um gaúcho e um cearense, representantes de culturas com autoestima suficiente para não aceitarem o tradicional marketing paulista sem algum questionamento.
Em Minas Gerais, onde o PSDB ainda tem patrimônio político e guarda certa esperança sebastianista de volta ao poder, foram vários os relatos de incursões de emissários de Doria que geraram desconforto nos tucanos locais. Com pouco tato, muita empáfia e visivelmente alheios ao legado que teve início na Guerra dos Emboabas, os tucanos paulistas conseguiram tornar ainda pior uma relação que já vinha muito ruim com o PSDB mineiro – desde que Doria deu início a uma cruzada interna contra Aécio Neves.
O resultado foi a manifestação do PSDB mineiro que formaliza o apoio ao gaúcho Eduardo Leite como pré-candidato à Presidência da República, o que contribui fortemente para negar o caráter “nacional” aos desejos de poder de Doria.
Distante da disputa familiar que toma o PSDB, o eleitorado nacional destina apenas 4% de intenções de voto a qualquer dos principais candidatos tucanos à Presidência – em pesquisa divulgada em 17/9. Doria recuou 1 ponto desde a última pesquisa, enquanto Leite somou 1 ponto, levando os herdeiros ao empate na disputa por uma herança que vale centavos. Seguindo assim, a disputa pela terceira via passará longe dos tucanos em 2022.