PAULO DINIZ

Por que partidos importam: o caso da candidatura de Marcio Lacerda

Nem aceita, nem rejeitada, a opção foi simplesmente negada


Publicado em 28 de agosto de 2018 | 03:00
 
 
 
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Em outubro de 2017, o Supremo Tribunal Federal começou a analisar o caso de Rodrigo Mezzomo, que tentara concorrer ao cargo de prefeito do Rio de Janeiro no ano anterior, mas que tivera o registro de sua candidatura negado. O motivo para essa rejeição foi simples: Mezzomo não era filiado a nenhum partido político, o que contraria a legislação eleitoral. A contestação feita por Rodrigo Mezzomo, entretanto, deriva da análise de princípios básicos da Constituição: enquanto os direitos civis, relacionados à igualdade e à liberdade das pessoas, têm sua aplicação imediata garantida por vários dispositivos constitucionais, o mesmo não pode ser dito dos direitos políticos, pois esses dependem da filiação partidária para serem plenamente efetivados.

Considerando que os partidos políticos são instituições autônomas e, por isso, podem tomar livremente suas decisões, temos então um impedimento institucional para que os brasileiros exerçam totalmente seus direitos políticos. Por exemplo, não há garantias de que algum partido político concorde em aceitar como bandeira as demandas específicas de certo grupo social, e se nenhum partido endossa a candidatura que enfeixe tais valores, então não há possibilidade de que essas pessoas tenham um representante eleito que fale por elas diante do Estado.

A democracia no Brasil opera dentro de limites estreitos, que são definidos por pessoas que não têm compromisso com a realização dos direitos da população – mas sim com o crescimento da instituição partidária que elas comandam. Trata-se, afinal, de uma falha estrutural do sistema político brasileiro: figuras orientadas pelo autointeresse são, em uma visão ampla, responsáveis pela seleção de quais interesses coletivos serão levados para a escolha da população.

Não há prazo definido pelo STF para a resolução do caso das candidaturas avulsas. Enquanto isso, as estruturas partidárias brasileiras continuam como uma das mais obscuras instâncias de poder. O caso da candidatura de Marcio Lacerda ao governo mineiro, abortada pela direção nacional do partido (PSB), é apenas o episódio mais recente em uma lista de situações nas quais as articulações partidárias de bastidores mudaram profundamente o cenário que o eleitor teria diante de si na urna.

O desejo do eleitorado mineiro por uma alternativa à desgastada rivalidade entre PT e PSDB, demonstrado pelo sólido terceiro lugar ocupado por Lacerda nas pesquisas de intenções de voto, foi suprimido por meio de uma manobra partidária. Contingências do quadro eleitoral pernambucano fizeram com que a direção nacional do PSB se aliasse ao PT: o nome de Lacerda, séria ameaça às pretensões de Fernando Pimentel de se reeleger, deveria ser retirado da disputa mineira. Uma decisão que passou longe de Minas e eliminou a possibilidade de submeter a escolha de Lacerda ao povo das Alterosas: nem aceita, nem rejeitada, essa opção foi simplesmente negada.

Em que pese a grande quantidade de partidos hoje existentes no país, tida por muitos como democrática ao multiplicar os caminhos disponíveis para pretendentes a candidatos, vale lembrar que as pequenas agremiações também reproduzem internamente estruturas de poder e estão sujeitas a pressões das agremiações mais tradicionais. Os pequenos partidos são, portanto, um frágil paliativo para o grave déficit democrático que aflige o sistema partidário nacional, problema que atinge com mais ênfase Minas Gerais.

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