Eleições municipais

Surpreender-se é uma escolha

Em 2024, teremos as eleições municipais mais importantes desde a redemocratização do país...

Por Paulo DIniz
Publicado em 02 de janeiro de 2024 | 03:00
 
 
 
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Em 2024, teremos as eleições municipais mais importantes desde a redemocratização do país. Da última vez em que foram escolhidos prefeitos e vereadores, em 2020, a pandemia do coronavirus estava fora de controle, e a própria data da votação chegou a ser adiada. Havia medo no ar, e o tema da pandemia confundiu a agenda de discussões em muitas cidades. Por exemplo, a decisão de fechar o comércio para reduzir contaminações foi tema importante em muitos municípios, sendo que esse assunto perdeu relevância logo depois, com o avanço da vacinação. Partidos, alianças, ideologias e mesmo a folha de serviços prestados por cada candidato ficaram em segundo plano - ou, se fundiram em mensagens confusas que marcaram uma não-campanha.

Nos últimos quatro anos, uso da internet cresceu ainda mais expressivamente no Brasil, assim como a individualização do acesso às informações - em parte, devido ao impulso dado pela pandemia. A decisão do voto vem se tornando cada vez mais uma escolha individual, o que muda algumas das mais profundas estruturas da democracia brasileira.

O paradigma das lideranças, por exemplo, deve sofrer um abalo em 2024, ainda maior do que o sofrido nos pleitos nacionais de 2018 e de 2022. Cada vez menos, blocos de eleitores serão conduzidos como rebanhos mansos a votar nos candidatos indicados por líderes políticos - mesmo que esses líderes tenham sido, eles mesmos, bem votados em eleições anteriores. A confiança do eleitor será, cada vez mais, fruto de um julgamento de momento, baseado nos dados que chegarem às mãos de cada cidadão - o fato de um candidato específico ser recomendado pessoalmente por Lula ou Bolsonaro será só mais uma peça dessa equação.

Isso porque, para além da evolução da tecnologia, temos também no Brasil o amadurecimento da democracia. As eleições diretas para todos os municípios foram retomadas em 1985 - quando mais de 58% da população brasileira atual ainda não havia nascido. A experiência de continuidade democrática é a regra para a maioria dos brasileiros hoje, de forma que já é disseminado o entendimento de que prefeitos e vereadores “vêm e vão” - independentemente da motivação do voto, logo virá outra eleição e nova oportunidade de escolher.

Candidatos com “boas referências” se mostraram fracassos após eleitos, assim como novatos promissores também já deixaram muito a desejar. Os eleitores brasileiros, assistindo a essas sucessões de erros e acertos, vêm aprendendo que as escolhas se fazem por conta própria - principalmente, a partir da entrega de bens e serviços públicos de qualidade.

Essa mudança não ocorre em todo o país de maneira uniforme, na mesma velocidade - mas não há dúvida de que avança em todas as regiões e rincões.

Para quem subestimar a capacidade de aprendizado do eleitorado brasileiro, 2024 vai trazer grandes surpresas. A frase segundo a qual “brasileiro não sabe votar”, de autoria de algum general-presidente hoje insignificante, irá definitivamente para o degredo do folclore político nas eleições desse ano.

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