PAULO DINIZ

Um artigo árido

Existe um alto risco, atualmente, de que a discussão sobre a adesão de Minas Gerais ao regime de recuperação fiscal se desenvolva dessa forma deturpada

Por Paulo Diniz
Publicado em 12 de dezembro de 2023 | 06:00
 
 
 
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É comum que temas técnicos sejam discutidos em arenas políticas sem o devido esforço para que se realizem os aprofundamentos necessários. Nesses casos, aparências e significados muitas vezes não coincidem, de forma que algumas decisões acabam sendo tomadas em sentidos contrários àqueles que a população realmente preferiria. Mesmo que muitos políticos contem com assessorias técnicas, é difícil traduzir alguns assuntos para o público leigo, assim como pode ser impossível conciliar decisões técnicas com o simbolismo das posições defendidas por alguns políticos.

Existe um alto risco, atualmente, de que a discussão sobre a adesão de Minas Gerais ao regime de recuperação fiscal se desenvolva dessa forma deturpada. Políticos manobram símbolos, que fazem sentido em termos eleitorais, mas que, tecnicamente, são desastrosos. Dessa forma, é preciso enfrentar a aridez de alguns temas, ao menos para se desfazer parte da confusão.

A agenda liberal tem por base a ideia de que o setor privado é mais eficiente do que o setor público. Portanto, seria interessante reduzir o Estado ao mínimo, fazendo também com que, nos setores indispensáveis, os agentes empresariais possam se envolver no atendimento à sociedade. A desobediência a esses princípios, na visão liberal, seria responsável pelo endividamento excessivo do Estado e por sua progressiva inviabilidade.

A crença nesse pacote de ideias é disseminada, pois já foram muitas as campanhas didáticas voltadas para popularizá-las. Entretanto, nenhuma dessas afirmações é definitiva. Por exemplo, grandes conglomerados privados vêm sendo responsáveis por fracassos retumbantes no Brasil, como a Americanas e as empresas de Eike Batista.

No mesmo sentido, não há processo seletivo, na iniciativa privada, que envolva tantos candidatos, com qualificações tão elevadas, e que os submeta a testes tão intensos como ocorre nos concursos públicos brasileiros.

Ainda assim, o receituário liberal para melhorar os resultados do Estado segue girando em torno da absorção de pessoas e práticas do setor privado. Essa crença simplista ainda é cultuada nos ambientes palacianos de Minas Gerais, apesar da abundante evidência científica contrária. Desde a década de 1970, foram feitas inúmeras experiências no Reino Unido a partir da implantação de práticas do setor privado no funcionamento do Estado – e o suposto “toque de Midas” do mundo empresarial se mostrou uma ilusão. As evoluções obtidas na operação do Estado britânico vieram, majoritariamente, das inovações propostas ao setor público – enfim, aperfeiçoar o público, em vez de descartá-lo em favor do privado.

O endividamento do Estado, por sua vez, está ligado muito mais às escolhas políticas dos governantes do momento, e não necessariamente ao desempenho operacional dos servidores públicos. Decisões ruins geram prejuízos e dívidas, independendo de quem as coloca em prática. Que o diga o próprio Zema, que elevou em quase 45% a dívida mineira durante seus cinco anos de experiência liberal.

 

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