PAULO PAIVA

Crescer é preciso, mas o sucesso dependerá dos primeiros passos

A arte da política será a única porta para alcançar esse objetivo


Publicado em 21 de novembro de 2018 | 03:00
 
 
 
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Embora os candidatos que foram para o segundo turno não tenham debatido seus programas para a economia, a nítida divergência quanto ao que fazer era explícita. Para enfrentar o dilema entre baixo nível de emprego e alto desequilíbrio fiscal, Haddad propunha primeiro estimular o crescimento para gerar empregos por meio da expansão da demanda, aumentando ainda mais o déficit fiscal de governo, para depois então, com o aumento da receita tributária, ajustar o orçamento público. Bolsonaro, ao contrário, na voz de Paulo Guedes, propunha reduzir drasticamente e antes de qualquer coisa as despesas públicas, reformar o setor público, diminuir a intervenção estatal no mercado e agilizar as privatizações para destravar a economia pela via da oferta e, em consequência, estimular o crescimento dos investimentos privados.

O mercado ficou otimista com a vitória de Bolsonaro. A euforia tomou conta da Bovespa. Em outubro, a Bolsa subiu 10,2% e, na primeira quinzena de novembro, mais 1%. Mesmo com as oscilações externas, o real valorizou 7,2% em outubro, e, mais importante, a taxa de câmbio estabilizou-se em torno de R$ 3,75 por dólar, acabando com a volatilidade do período eleitoral.

Segundo as mais recentes estimativas semanais do Relatório Focus, divulgadas pelo Banco Central na segunda-feira passada, o mercado espera estabilidade na inflação, fechando 2018 em 4,13% e 2019 em 4,20%; portanto, abaixo do centro da meta. As expectativas para a inflação vêm se reduzindo ligeiramente nas últimas quatro semanas. Também há previsão de que a taxa de câmbio mantenha-se entre R$ 3,70 e R$ 3,74 até o final do próximo ano.

No entanto, esse otimismo com a vitória de Bolsonaro não afetou as estimativas do crescimento do PIB para 2019 e 2020, que continuam congeladas em 2,5%, desde o mês de junho, após ter atingido 3,0% em maio. Muito embora 2,5% possam parecer um grande avanço em relação ao lento crescimento abaixo de 1,5%, aguardado para este ano, não refletem o otimismo dos agentes econômicos com a eleição de Bolsonaro, que entregou o comando da economia a um defensor do liberalismo econômico, tão ao gosto do mercado.

Se o caminho antevisto por Haddad parecia um passeio sem dor, o de Bolsonaro, que agrada ao mercado e é mais realista, exige muita convicção do governo e entendimento da sociedade, do que os agentes econômicos ainda não estão convencidos. Há desconfiança em relação ao crescimento depois de 2019. Não é uma caminhada fácil. Não há lugar para erros.

A agenda de reformas começará pela mais complexa, a da Previdência Social, que atinge tanto os interesses de fortes corporações do setor público, nas diferentes esferas do governo, quanto a narrativa disseminada na população de que elimina direitos. Será um teste crucial para a habilidade de negociador e a experiência de quase três décadas de vida parlamentar de Bolsonaro para construir sua base de apoio, que contará com elevada participação de inexperientes deputados de primeiro mandato, e para enfrentar a ferrenha oposição da esquerda, ferida com as derrotas acumuladas nos últimos dois anos.

O resultado desse teste determinará quais serão os passos seguintes e como serão as próximas batalhas, tanto na agenda de reformas quanto na reconquista da confiança dos investidores em um cenário externo marcado por incertezas. 

O caminho ficará mais difícil se o governo seguir o clima beligerante da campanha e não conseguir unificar o país nesta difícil quadra de sua história. A arte da política será a única porta para o sucesso.

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