A gestão fiscal da União já era muito difícil antes da pandemia. As receitas não cobriam as despesas públicas, mesmo excluídas as financeiras. Há muitos anos, as despesas do governo crescem mais rapidamente do que o PIB e, em consequência, do que as receitas. Isso gera déficits primários, expandindo, assim, a dívida pública.

Vários são os fatores responsáveis por esse desequilíbrio. Do lado das despesas, os principais são o crescimento rápido dos gastos com a Previdência Social e a indexação de várias despesas, principalmente de benefícios sociais ao salário mínimo. Do lado da receita, destacam-se o baixo crescimento do PIB e o volume de isenções e subsídios sem benefícios econômicos ou sociais.

A Emenda Constitucional (EC) 95/2016 limitou o aumento global dos gastos da União por 20 anos, impondo um teto limitado à variação da inflação do ano anterior. O pressuposto dessa regra foi dar um prazo para que reformas fossem feitas visando ao equilíbrio estrutural entre despesas e receitas e à retomada do crescimento econômico. Uma revisão dessa regra em 2026 está prevista.

A pandemia alterou profundamente esse cenário. Os gastos emergenciais, garantidos pela Reforma Constitucional 106/2020, que instituiu o regime extraordinário fiscal e financeiro durante o estado de calamidade, devem elevar o déficit primário neste ano para 12,7% do PIB, conforme estimativa da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado.

Para 2021 o governo se vê na encruzilhada entre submeter-se à austeridade do teto de gastos ou abandoná-la para continuar com as transferências de renda à população vulnerável e, eventualmente, criar novos gastos em infraestrutura para estimular a economia. Na proposta orçamentária para 2021 não há previsão de novos gastos.

Tampouco as reformas na pauta do Parlamento consideram as necessidades prementes, pois não teriam impactos imediatos sobre o Orçamento do próximo ano, como as propostas das reforma tributária e administrativa.

Não é política nem socialmente factível iniciar 2021 sem um amplo programa de transferência de renda. A EC 95/2016 prevê gatilhos a serem disparados para corrigir eventuais aumentos acima do teto. Utilizar esses dispositivos, com transparência, juntamente a um plano factível de retorno ao equilíbrio orçamentário nos próximos anos, seria o caminho.

O teto de gastos não é um dogma, no entanto as saídas devem ser construídas por intermédio de entendimentos tanto políticos, com os parlamentares, para votação das alterações legislativas necessárias à redução da expansão das despesas e à exclusão já das isenções tributárias, quanto institucionais, com os Poderes Legislativo e Judiciário, para evitar a judicialização da execução orçamentária. Mas o clima de ódio e a antecipação da disputa presidencial são obstáculos à construção de soluções acordadas.

Só há uma certeza: o Orçamento enviado ao Congresso é inexequível.