PAULO HADDAD

Eletrobras e a prática empresarial do capitalismo de compadrio

Redação O Tempo


Publicado em 18 de maio de 2018 | 03:00
 
 
 
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Um arcebispo visitou uma paróquia numa pequena cidade do interior de Minas, e, ao chegar lá, o pároco se apressou em lhe informar o motivo pelo qual os sinos não repicaram em homenagem a sua presença. Explicou ao arcebispo que isso estava ocorrendo por sete motivos. Curioso, o arcebispo perguntou quais eram esses sete motivos. O pároco começou a alinhá-los afirmando, em primeiro lugar, que os sinos tinham ido para a capital para serem consertados. 

Também não são necessários sete motivos para explicar a necessidade de privatização da Eletrobras.

Sua privatização tornou-se indispensável e inadiável, de um lado, porque está atualmente muito endividada e fragilizada do ponto de vista econômico-financeiro, sendo que seu controlador, o governo federal, se encontra em profunda crise fiscal e incapaz de reerguer a holding.

Por outro lado, o relativo insucesso no desempenho organizacional não só da Eletrobras, mas de inúmeras empresas estatais, se agravou com a partilha político-partidária no recrutamento de seus quadros técnicos e gerenciais. A alta direção dessas empresas passou a ser formada não mais por critérios de competência e de mérito profissional, mas por indicações baseadas no fisiologismo político da base aliada, tendo como contrapartida, no mundo dos negócios, a prática empresarial do capitalismo de compadrio. Muitas empresas estatais passaram, então, a ser compreendidas politicamente como fontes de recursos para o financiamento de campanhas eleitorais e de esquemas de propinas.

Mesmo considerando que a metamorfose das empresas estatais aconteça com muitos acertos e alguns desacertos, o balanço geral das privatizações no Brasil é extremamente positivo do ponto de vista macroeconômico e microeconômico. As empresas privatizadas deixaram de pressionar os déficits fiscais pela redução das necessidades de financiamento; contribuíram para a retomada dos investimentos em setores estratégicos; trouxeram saldos positivos para os superávits primários do setor público consolidado e para o saldo das transações correntes nas contas externas; aumentaram inequivocamente os níveis de competitividade sistêmica nos setores e nos ramos industriais de sua atuação.

Considera-se que uma das alternativas para a retomada do crescimento do Brasil é a de estruturar e implementar um amplo programa de investimentos em infraestrutura econômica, particularmente nos segmentos de logística e de energia (incluindo as energias renováveis). Esses grandes projetos de investimento são capazes de dinamizar poderosas cadeias produtivas com seus efeitos de dispersão intersetorial para frente e para trás, e com seus efeitos multiplicadores sobre os níveis de renda, de emprego e da base tributável.

No caso específico do processo de privatização da Eletrobras, por ser uma instituição básica num setor estratégico da economia brasileira, todo cuidado é pouco. É compulsório, na concepção do modelo de sua privatização, que sejam fortalecidas as agências reguladoras e de planejamento (Aneel, ONS, CCEE, EPE) do governo federal, que visam a defender o interesse público junto aos novos controladores em suas decisões operacionais e estratégicas, evitando-se que sejam capturadas pelos interesses privados que têm de regulamentar.

É recomendável também que, no processo de privatização, as condicionalidades a serem impostas aos novos controladores sejam apenas aquelas que são essenciais para não comprometer sua capacidade de investimento no futuro. É preciso igualmente estar atento às dissidências doutrinárias que surgem em todo processo de privatização, pois, como disse Millôr Fernandes, “quando as ideologias envelhecem, elas vêm morar no Brasil”.

 

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