PAULO HADDAD

Estilo de governar: a hora e a vez da Grande Transformação

Mudança surge nas experiências históricas de muitos países


Publicado em 13 de julho de 2018 | 03:00
 
 
 
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No final deste ano, o Brasil estará encerrando mais uma tentativa de realizar um ajuste fiscal, sem sucesso. As contas públicas continuam profundamente desequilibradas, o crescimento econômico é inexpressivo, as taxas de desemprego e subemprego muito elevadas e o desalento tomaram conta do “espírito animal” dos empreendedores. Há certa fadiga e descrença dos eleitores quando observam os primeiros compromissos de alguns dos candidatos à Presidência da República e percebem que suas propostas para a política econômica podem ir em direção de “mais do mesmo e pior”. É provável que, se um novo plano de governo não propuser e implementar soluções consistentes e sustentáveis para problemas estruturais brasileiros, a perspectiva do futuro venha a ser pior do que a situação do presente.

O estilo de condução das políticas públicas para resolver nossos problemas socioeconômicos e socioambientais tem sido o que se denomina de “ajustes incrementais”. Segundo esse estilo de governar, mesmo sem uma visão do futuro, sempre que os formuladores das políticas públicas encontram um hiato entre uma realidade observada e uma situação ideal, adotam em seguida medidas de comando e controle ou mecanismos de mercado para preencher esse hiato. Ao fechá-lo, contudo, sempre se abrem outros; ao se resolver um problema, criam-se outros, e então estes passam, num momento seguinte, a ser percebidos como problemas, e são realizadas novas tentativas com o objetivo de fechar os hiatos entre as situações ideais e a realidade.

Esse estilo pragmático de governar, com foco no curto prazo, pode ramificar-se quase indefinidamente, e há muitas situações em que se torna razoavelmente bem-sucedido como padrão de resolver problemas e mobilizar os potenciais de desenvolvimento de um país ou de uma região.

A situação muda totalmente de figura quando a exaustão de um ciclo de prosperidade ocorre e a economia perde sua dinâmica de crescimento. O desenvolvimento econômico não é um subproduto cronológico de um ajuste qualquer. Num contexto em que prevalecem, simultaneamente, uma crise social e uma crise ambiental, surgem problemas de grande dimensão, complexidade e transversalidade, que podem não ser percebidos e, muito menos, resolvidos por nenhum protagonista ou instituição isoladamente, que se encontram, muitas vezes, autocentrados em seus interesses específicos.

Emerge, pois, a necessidade de um novo e indispensável estilo de governar, baseado num enfoque de perspectiva ou de visão de futuro, no qual as ações programáticas sejam de natureza reestruturante, e não incrementais, vocacionadas para grandes mudanças e transformações econômicas e político-institucionais radicais, no sentido de buscar as raízes dos problemas. Esse novo estilo aparece nas experiências históricas de desenvolvimento de muitos países, com a denominação de Grande Transformação.

Karl Polanyi, que analisou a Grande Transformação do capitalismo nos Estados Unidos e na Suécia, a partir da crise de 1929, concluiu: “A crença no progresso espontâneo pode cegar-nos quanto ao papel do governo na vida econômica. Este papel consiste, muitas vezes, em alterar o ritmo de mudança, apressando-o ou diminuindo-o, conforme o caso. Se acreditarmos que tal ritmo é inalterável ou, o que é pior, se acreditarmos ser um sacrilégio interferir nele, então não existe mesmo campo para qualquer intervenção”. Assim, propor programas de governo para o novo mandato presidencial, baseados apenas em mudanças incrementais dos hiatos observados, pode significar uma conduta insuficiente pela sua baixa capacidade transformadora e tímida para os limites do possível que se abrem para o futuro do nosso país.

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