O samba é um dos maiores patrimônios culturais que nosso país possui. Segundo definição dos historiadores Nei Lopes e Luiz Antônio Simas, pode-se entender como o gênero de canção popular em dança de roda semelhante ao batuque, com dançarinos solistas, difundida em todo o Brasil com variantes coreográficas e de acompanhamento instrumental.
Como afirmam, é uma expressão popular presente em todo o país. Minas tem muito samba no pé, mas o mineiro ainda é acanhado em divulgar sua contribuição na criação e valorização do gênero cultural. Até por aqui, muita gente acredita que é uma invenção apenas de baianos e cariocas; estes, sim, especialistas em divulgar suas artes.
Uma importante iniciativa veio para mudar essa sina. Há poucos dias, uma cerimônia foi realizada no Mercado da Lagoinha, região que é berço cultural da capital, para declarar o samba patrimônio cultural imaterial de Belo Horizonte. Ali foi analisado o Inventário Participativo e Dossiê de Registro, um trabalho de pesquisa que investigou os vários movimentos do samba, além da história, das influências e das tradições do gênero cultural.
O processo começou por uma ação da Escola de Samba Cidade Jardim, a mais tradicional da capital mineira. Em 2015, ela solicitou a abertura do processo de registro imaterial da sua quadra. A partir daí, ampliou-se a análise que culminou no reconhecimento de todo o samba da cidade. Tive a alegria e a honra de contribuir para o processo, por meio da destinação de uma emenda parlamentar solicitada pelo Coletivo de Sambistas Mestre Conga, que coordenou o processo junto do Projeto República, da Universidade Federal de Minas Gerais, e a Secretaria Municipal de Cultura. Também participou do financiamento uma emenda destinada pela então vereadora de BH Macaé Evaristo (PT), hoje ministra dos Direitos Humanos.
A história do samba em Belo Horizonte ficou escondida por muito tempo, até surgirem movimentos criados pelos próprios sambistas, que, independentemente do poder público ou da academia, iniciaram projetos como a Faculdade do Samba, criado em 1995 por iniciativa de figuras como Mestre Conga. Três décadas depois, um coletivo que leva o seu nome retomou a empreitada de dar visibilidade e reconhecimento ao samba mineiro e conseguiu o reconhecimento como patrimônio cultural imaterial. Assim, a história pouco conhecida pela população da cidade e do Brasil começa a ser revelada por pesquisadores diretamente vinculados ao mundo do samba.
Minas Gerais teve uma grande contribuição na perpetuação do samba por suas tradições africanas serem uma das mais fortes do país, com culturas similares, como o congado e as folias de reis. A trajetória em Belo Horizonte tem como marco a iniciativa de dois nomes da região da Pedreira Prado Lopes: Dionísio José de Oliveira, o Xuxu, e Mário Januário da Silva, o Popó. Eles fundaram em 1936 a primeira escola de samba de Belo Horizonte de que se tem registro, a Pedreira Unida. Outros nomes construíram sua história e deixaram grande legado no samba, como Jairo Pereira da Costa, patriarca da agremiação Cidade Jardim.
O registro do samba como patrimônio cultural imaterial poderá fomentar políticas de salvaguarda para os mestres e mestras, as escolas de samba, os blocos de rua e caricatos, as rodas de samba, as práticas de preservação de acervos e os projetos de educação patrimonial. Toda essa constelação de iniciativas, projetos e sonhos, além de melhorar a qualidade de vida dos sambistas e das sambistas, poderá fomentar uma cadeia produtiva em Belo Horizonte, com a profissionalização de sambistas, a divulgação de sambas autorais e a ampliação do mercado de trabalho para músicos, compositores, carnavalescos, produtores e estabelecimentos culturais.
Com o reconhecimento conquistado em Belo Horizonte, o samba está agora em vias de ser considerado patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais. A partir de uma solicitação do Coletivo de Sambistas Mestres Conga, foi assinado um termo de abertura do processo de registro do gênero musical pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), e em breve será apresentado o relatório para estender a valorização para o samba de todo o Estado.
REGINALDO LOPES
Deputado federal (PT-MG)
dep.reginaldolopes@camara.gov.br