RICARDO CORRÊA

Os motivos da Ficha Limpa

Redação O Tempo


Publicado em 14 de julho de 2018 | 03:00
 
 
 
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Aquinta-feira na Câmara dos Deputados marcou o arquivamento, pelo Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, de duas representações que pediam a cassação dos mandatos de Celso Jacob (MDB-RJ) e João Rodrigues (PSD-SC). Ambos não são acusados ou suspeitos, mas condenados, em último grau, já estando em cumprimento de pena. Mais que isso, cumprem prisão em regime aberto e semiaberto, respectivamente, em Brasília, saindo para trabalhar representando, ao menos em tese, o cidadão brasileiro que o elegeu. (Nota: O texto informava inicialmente que o regime de Celso Jacob também era o semiaberto e foi corrigido às 15h35 do dia 16/7/2018).

O emedebista, detido desde junho do ano passado, foi absolvido pelos colegas com apenas um voto contra e onze. Os colegas entenderam que seus atos não causaram prejuízo aos cofres públicos, ocorreram antes do mandato e extrapolam os prazos de prescrição. A Justiça, porém, entendeu diferente. Ele foi condenado pela primeira vez em 2006, por falsificação de documento público e dispensa irregular de licitação quando era prefeito de Três Rios. De tanto manejar recursos, acabou solto até o ano passado. Para piorar, chegou a ter o benefício do regime semiaberto revogado após tentar entrar no presídio com um provolone na calça (Nota: O texto dizia, incorretamente, que o provolone havia sido apreendido na cueca, mas a informação foi corrigida às 15h33 do dia 16/7/2018).

No caso de João Rodrigues, nenhum colega dignou-se a votar por sua condenação. Para o Conselho de Ética, o parlamentar é inocente das acusações de comprar, ignorando a necessidade de licitação, uma retroescavadeira, em 1999, quando era prefeito de Pinhalzinho, Em Santa Catarina. Ao contrário dos colegas corporativistas, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região condenou o hoje parlamentar. Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF) concordaram, negando todos os recursos apresentados. Ainda assim, já condenado em última instância, assim como Jacob, ele continuará deputado.

Embora triste para a democracia brasileira, a decisão da Câmara demonstra de forma cabal a importância de instrumentos como a Lei da Ficha Limpa, tão bombardeada pela classe no momento em que as condenações de políticos, tão raras no passado, começam a brotar não apenas na primeira, mas na segunda instância. Se os deputados assumem que, mesmo após a condenação em última instância, um parlamentar continuará deputado até o fim de seu mandato, então é melhor mesmo que ele não possa, em nenhuma hipótese, concorrer estando condenado.

A alternativa à Ficha Limpa seria a conscientização do eleitor e mudanças tão profundas em nosso sistema político que passariam por uma reforma que os atuais detentores de mandato, obviamente, nunca aceitariam fazer. Com o controle da máquina partidária, que inclui dinheiro e, consequentemente, apoio para que se elejam qualquer que seja a acusação que enfrentam, e com respaldo dos colegas para permanecerem na função mesmo presos, a despeito de pressões da opinião pública, só há um jeito de tirar condenados da disputa democrática: a letra fria da lei.

Resolve? Claro que não. Basta ver que entre os que salvaram os colegas condenados estão tantos outros que ainda não acertaram as contas com a Justiça. Mas limpar a política depende de dar passos à frente e não voltar algumas casas no combate à corrupção Doa a qual pretenso candidato doer.

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