SANDRA STARLING

Escancarando os privilégios e exibindo o circo

Redação O Tempo


Publicado em 17 de maio de 2017 | 03:00
 
 
 
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Pertenço à velha escola do direito, em que este, como privilégio dos ricos e poderosos, tem um linguajar próprio repleto de mesuras e rapapés. Mas tento, desesperadamente, pertencer a um mundo que, com certeza, não vou ver: um mundo de iguais.

Repetindo velho hábito, acompanhei o dia todo as imagens da praça de guerra instalada em Curitiba para depois assistir, “tim-tim por tim-tim”, ao depoimento do ex-presidente Lula ao juiz Sergio Moro.

Como tenho formação acadêmica que mistura direito, sociologia e ciências políticas, fico atenta a cada detalhe.

Lula aterrissa em Curitiba num jatinho particular, que, se soube logo, seria de propriedade de Walfrido dos Mares Guia, que foi seu ministro, e que agora estaria emprestado ao presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi – aquele que o ex-presidente havia sugerido a Dilma para o Ministério da Fazenda no segundo mandato. Por que alguém com tantas acusações de receber favorecimentos ilícitos de empresários resolve ir prestar depoimento a seu “justiceiro” valendo-se de uma aeronave que tão poucos podem ter?

A isso casa-se a ostentação de intimidade com o presidente da todo-poderosa OAS, José Adelmário Pinheiro Filho, tratado como “Léo”. Ora, um presidente que nada viu, nada soube, nada conhecia nem do que se passava em sua própria casa, ou que desconhecia tudo de seu próprio governo, por que haveria ele de ser tão prestigiado pelos poderosos do país?!

Por que de “bate-pronto” ele lembrava que Nestor Cerveró fora indicado pelo PMDB e Zelada, sucessor daquele, pelo PMDB de Minas, e quanto a quem dizem ter representado o PT na Petrobras, Renato Duque, este teria sido indicado genericamente pelo “Congresso”? Uai, qual Congresso? O Congresso Nacional, onde nada é consensual?

Em seguida, a casca de banana com a qual Lula, com certeza, queria comprometer Moro: quando declarou que será candidato em 2018. A provocação teria o objetivo de levar o juiz a retrucar que 2018 está longe e ainda vai depender de que Lula não seja preso nem impedido de se candidatar...

O circo ficou por conta de várias perguntas do procurador Pozzobom. Ponto para o “amicus curiae” da Petrobras, pois o idoso advogado tentou repor a audiência ao nível do respeito de antigamente com o Judiciário, ao tempo de meu falecido pai.

Por último, o que mais doeu. Quando Lula quis explicar ao juiz por que achou 500 defeitos no apartamento do Guarujá, denominou-o triplex do programa Minha Casa, Minha Vida. Em 1982, eu ironizava as casas populares lançadas por Delfim Netto, dizendo, nos palanques, que o banheiro era tão pequeno que, se ele lá fosse tomar banho, o sabonete pularia fora. Depois, cheguei a fazer uma maquete para, da tribuna, mostrar como eram pequenas as casas populares de Newton Cardoso na Nova Contagem.

Duro é ver agora Lula, filho da miséria, dizer que o triplo de um apartamento do famoso programa não lhe basta. Para ele, tudo deve seguir como sempre foi: aos ricos e poderosos, o banquete. Aos pobres, o que restar das sobras.

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