Lembrei-me desses versos de Violeta Parra vendo a lambança que se passou na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro nos últimos dias. Um tribunal (TRF-2) havia determinado a prisão preventiva do presidente daquela Casa e de mais dois deputados estaduais. Com base em recente decisão do STF, que se aplicou a Aécio Neves, submeteu seu acórdão àquele Parlamento. Os deputados, sem tomarem conhecimento do tribunal, determinaram que os colegas fossem soltos. E os investigados acabaram voltando à prisão porque alvará de soltura algum fora expedido pelo tribunal.
Quando o STF foi levado, em maio de 2016, por ocasião do caso Cunha, a decidir se, tratando-se de suspensão de mandato parlamentar, teria ou não de submeter sua decisão à respectiva Casa legislativa, procurou-se empurrar com a barriga qualquer deliberação vinculante. Deu bode. Depois, já em 2017, no calor do “affair” Aécio, sem o menor constrangimento, desconstruíram a decisão unânime que haviam tomado, no ano anterior, no sentido de suspender o mandato do deputado Eduardo Cunha, sem autorização da Câmara dos Deputados. Em maio de 2016, não havia precedentes. Daí recorreram, por analogia, a um julgado de agosto de 2006, ocasião em que fora rejeitado um habeas corpus formulado pelo presidente da Assembleia Legislativa de Rondônia. Dito parlamentar havia sido preso em flagrante, e sua prisão, mantida pelo STF, sem audiência daquela Assembleia. A relatora do habeas corpus, ministra Cármen Lúcia, fez tábula rasa dessa oitiva, ao argumento de que o Parlamento daquele Estado federado vivia uma “anomalia institucional, jurídica e ética”. Para quem não se recorda, na época, 23 dos 24 deputados estaduais rondonienses estariam envolvidos nas mesmas falcatruas que levaram à prisão do presidente da Casa.
A lembrança daquela anomalia ensejou o conceito de “franca excepcionalidade” a justificar, no caso Cunha, a decisão autônoma do STF. E daí, já às voltas com o caso Aécio Neves, pulou-se para a exigência de uma “superlativa excepcionalidade”, a fim de que se consagrasse, em sentido inverso, a submissão da decisão judicial ao crivo do Senado Federal. Mas, afinal: a “doutrina Aécio”, depois de todo o “requinte” de sua construção jurídica, deve ou não ser aplicada no Rio de Janeiro? Ou será que o TRF-2 não tinha reparado na “anomalia institucional, jurídica e ética” em que há muito está metida a Alerj? Ou seja, lá no STF, tudo começou com um caso estadual, mas pode até ser que a casos estaduais semelhantes não se venha a aplicar, doravante, a orientação do próprio STF. Isso mais parece uma daquelas trilhas sonoras dos velhos desenhos de Tom e Jerry, fazendo fundo às idas e vindas das perseguições do maldoso gato ao simpático ratinho. O STF se enredou em uma tal confusão, “como a hera na pedra”, que fica difícil, hoje em dia, saber onde, afinal, está a tal anomalia, pelo menos, institucional.
E não seria, então, o caso de Suas Excelências, no mínimo, dizerem a Eduardo Cunha: “Desculpa, erramos”?!
Clique e participe do nosso canal no WhatsApp
Participe do canal de O TEMPO no WhatsApp e receba as notícias do dia direto no seu celular
O portal O Tempo, utiliza cookies para armazenar ou recolher informações no seu navegador. A informação normalmente não o identifica diretamente, mas pode dar-lhe uma experiência web mais personalizada. Uma vez que respeitamos o seu direito à privacidade, pode optar por não permitir alguns tipos de cookies. Para mais informações, revise nossa Política de Cookies.
Cookies operacionais/técnicos: São usados para tornar a navegação no site possível, são essenciais e possibilitam a oferta de funcionalidades básicas.
Eles ajudam a registrar como as pessoas usam o nosso site, para que possamos melhorá-lo no futuro. Por exemplo, eles nos dizem quais são as páginas mais populares e como as pessoas navegam pelo nosso site. Usamos cookies analíticos próprios e também do Google Analytics para coletar dados agregados sobre o uso do site.
Os cookies comportamentais e de marketing ajudam a entender seus interesses baseados em como você navega em nosso site. Esses cookies podem ser ativados tanto no nosso website quanto nas plataformas dos nossos parceiros de publicidade, como Facebook, Google e LinkedIn.
Olá leitor, o portal O Tempo utiliza cookies para otimizar e aprimorar sua navegação no site. Todos os cookies, exceto os estritamente necessários, necessitam de seu consentimento para serem executados. Para saber mais acesse a nossa Política de Privacidade.