SOMOS TODOS

Um ministro sem educação (e noção)

Minha sugestão para o ministro, se assim posso fazer, é: buscar conhecer melhor as escolas brasileiras e entender a diferença entre o que é empecilho e o que é falta de vontade de fazer acontecer


Publicado em 21 de agosto de 2021 | 03:00
 
 
 
normal

Meu primeiro contato com uma pessoa com deficiência foi na escola. Era uma aluna paraplégica, que também tinha comprometimento na fala, na audição e na visão. Ela era diferente de todos os outros alunos: demandava mais atenção dos professores e paciência dos colegas de classe, mas o meu aprendizado (e dos demais) nunca foi comprometido pela presença. Pelo contrário. Conceitos que hoje são tão importantes na sociedade, como adaptação, resiliência e empatia começaram a partir dessa relação.

Anos mais tarde, já na faculdade, debatia com uma pessoa sobre as escolas bilíngues e me lembro de ouvir: “quem me dera ter tido a oportunidade de estudar em uma mesma sala com alunos surdos”. Nunca me esqueci dessa frase. Também gostaria de ter dividido a sala com alunos surdos ou cegos .

É óbvio que ter uma pessoa que demanda acessibilidade dentro da sala de aula (e de qualquer outro espaço) é um desafio, mas nunca um empecilho. A questão é como fazer dar certo. Como preparar as escolas, os professores, demais alunos e funcionários para receber esses alunos. Como pensar em políticas educacionais inclusivas que vão garantir ingresso, permanência e êxito na educação de todos. Sem pensar nessas propostas, é “impossível a convivência” entre alunos com e sem deficiência. Entre alunos e um ambiente escolar acolhedor. Entre educação e sociedade.

Um estudo feito pelo IMD World Competitiveness Center, em 2019, que comparou a prosperidade e a competitividade de 64 nações, considerando o ambiente econômico e social do país para gerar inovação e se destacar no cenário global, o Brasil ficou em 64º lugar no ranking, ou seja, na última posição. E esse é só um exemplo.

Então, ao ouvir a fala infeliz do ministro da educação, Milton Ribeiro, nesta semana, sobre a “impossibilidade de convivência” de alunos com deficiência na escola e como esses podem “atrapalhar” o ambiente escolar, consigo, sem muito esforço, elencar vários pontos que atrapalham verdadeiramente a educação no Brasil, como: a falta de investimento que precariza o ensino e aumenta a disparidade educacional entre alunos de escolas públicas e privadas; a falta de segurança de algumas escolas brasileiras localizadas em áreas dominadas pelo tráfico de drogas, pontos de criminalidade e violência; a falta de condições e incentivos que levem o aluno à escola e não o deixem trocá-la pelo trabalho infantil; a desvalorização profissional dos professores e demais agentes escolares, entre outros.

Minha sugestão para o ministro, se assim posso fazer, é: buscar conhecer melhor as escolas brasileiras e entender a diferença entre o que é empecilho e o que é falta de vontade de fazer acontecer. Não saber diferenciar as duas coisas atrapalha muito a educação no Brasil.

 

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!