Não está claro se Donald Trump quer apenas ajudar Bolsonaro a escapar da cadeia ou derrubar o governo de Lula. Ou se ele acredita que um levaria ao outro. Mas está claro – e as informações de bastidores confirmam – que ele está disposto a escalar as ações contra o Brasil.
Diante dessa inédita crise nas relações centenárias entre os dois países, para todos os efeitos, o presidente brasileiro desistiu de negociar o lado político. Não há caminho possível neste momento para entendimentos “técnicos” (leia-se comércio e tarifas) por conta da questão política, mas Lula acha que nem vale a pena tentar.
Foi procurar no Brics um bloco que não existe. É claro no momento que Trump está fazendo uma escolha pelo Brasil – empurrando o país para o lado da China. No fundo está acontecendo exatamente o que deveria ser evitado, mas Lula está confortável com o tipo de situação, pois no fundo acredita que o Sul Global está do “lado certo” da história.
Chegou a louvar a possibilidade de “autossuficiência” do Sul Global, uma afirmação que expressa apenas a profunda ignorância do presidente brasileiro em relação a como funciona o mundo moderno. Não existe autossuficiência em parte alguma e Xi Jinping poderia ter lembrado o presidente brasileiro disso. Preferiu gastar com Lula palavras protocolares de pouco significado prático para um país, como o Brasil, que descobriu que nadava pelado quando a maré baixou.
Mas esse é apenas o primeiro autoengano. Um segundo autoengano tem a ver com o fato de que Lula parece mesmo convencido de que o esforço de Bolsonaro para escapar da cadeia com a ajuda de uma potência estrangeira, não importa quanto o país saia prejudicado, seria uma “virada do jogo”.
Não é. Os dados de pesquisas diversas indicam que o dano de popularidade sofrido pelo presidente tem fatores estruturais de longo prazo. Não há dúvidas de que Trump, querendo salvar Bolsonaro, está na prática ajudando Lula – que está desperdiçando essa vantagem pela incapacidade de, mais uma vez, formar uma aliança de amplo espectro.
Lula prossegue confiando nas armas de sempre, um tipo de assistencialismo agora costurado na medida para grupos sociais diversos, e o ar de “estadista” que Trump e Bolsonaro lhe emprestaram. Ignorando profundas transformações sociais exatamente nas áreas que sempre o garantiram: Nordeste e periferias das grandes cidades.
Assim, não é difícil entender na postura do governo a falta de um sentido de urgência diante dos danos econômicos e geopolíticos que o país está sofrendo. Lula acha que está ganhando.