Mario Adnet passou um longo período “olhando para o umbigo do outro”. Um exercício, aliás, que recomenda com especial atenção em tempos nos quais, lembra, o individualismo rege a sociedade. No entanto, em seu trabalho mais recente – “Saudade Maravilhosa”, cujo repertório apresenta dia 23 na capital mineira –, o compositor preferiu dar primazia à própria lavra. Ao seu próprio umbigo. Assim, das dez faixas, oito são autorais.
“Vinha de uma série de discos temáticos, dedicados a Baden Powell, Villa-Lobos, Jobim, Vinícius... Compositores que preciso ter vivos ao meu lado, até para toda essa coisa fazer sentido”, diz ele, que, no entanto, não deixou as homenagens de lado nesta empreitada. Das duas faixas que não assina, uma é “Viver de Amor”, de Toninho Horta e Ronaldo Bastos.
“Quando era adolescente, ouvi ‘Beijo Partido’, de Horta, e fiquei transtornado de felicidade com aquela música tão livre, tanto de melodia quanto harmonia. Eu e meu irmão (Chico Adnet) começamos a pesquisá-lo, ouvíamos ‘Litoral’, ‘Meu Canário Vizinho Azul’, e íamos comparando linguagens. Quando saiu ‘Viver de Amor’... Puxa, fiquei doido com aquilo”, rememora o músico, que um ano depois conheceu o mineiro, de quem se tornou amigo – e a quem espera reencontrar na nova passagem por BH.
Aliás, Adnet não esquece as vindas anteriores à cidade – inclusive com o extinto grupo Semente, no final dos anos 70. “A gente se apresentou umas três vezes no... Teatro Marília? Esse nome faz sentido para você?”, indaga, puxando a memória.
Onda carioca
O título do disco veio de uma sugestão do amigo Bernardo Vilhena. “Você sabe que ele é o autor de ‘Menina Veneno’, não é? A gente é parceiro também, mas de coisas menos venenosas”, brinca. Na verdade, o guitarrista Ricardo Silveira detectou uma “onda carioca” na música, até então, sem nome. Ao levar a teoria para Vilhena, veio a ideia do título – não só da faixa, mas do CD. “Achei perfeito. Sou carioca, e o disco tem uma influência de saudades maravilhosas. Ao mesmo tempo, há um senso sarcástico embutido, com a alusão à ‘cidade maravilhosa’ – que, na verdade, talvez nunca tenha existido. Mesmo porque, o que a gente vem ouvindo é que o humanismo está no fim – mas o que vem agora, não sei”.
Seja como for, o músico também entende que o repertório ecoa “uma coleção de saudades que não tem idade”. E de saudades mais certeiras também. Como a do amigo Guilherme Secchin, falecido ano passado, e a quem ele homenageia ao reproduzir uma tela (“Pedra Bonita Mario e Tom) na capa do álbum.
Em tempo: a outra não inédita é um clássico do jazz, “Caravan” (Juan Tizol e Duke Ellington)
A grande família
A família Adnet marcou presença ativa no álbum, incluindo as duas filhas: Antonia, na coprodução, e Joana, na assistência de direção musical. “Não fiz nada para elas entrarem neste mundo, mas passaram pela fase de ouvir Beatles, música pop e mais recentemente se aproximaram do que faço. É quase uma osmose. E são formadas em música, então, é bacana, a gente se dá muito bem, elas são muito sinceras, fazem críticas”.
Joana também lhe deu a neta Cecília, que, no CD, é homenageada na faixa “Cecília no Parquinho”. “Para ela, sou o Babu, e não o vovô – e quero que seja sempre assim. E é o Babu que a leva ao parquinho”, explica.
Antonia, que é violonista, virá com o pai a BH, dividindo o palco ainda com Marcos Nimrichter (piano), Jefferson Lescowitch (contrabaixo), Rafael Barata (bateria), Eduardo Neves (sax e flautas) e Everson Moraes (trombone).
Mario Adnet
Teatro Bradesco (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes) Quinta (23). Às 20h. R$ 80 (inteira)
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