Desde pequeno, Sergio Poroger acalentava o sonho de percorrer ao menos um trecho das railways norte-americanas. Mais tarde, já atuando como jornalista e fotógrafo, o paulistano de 61 anos resolveu arregaçar as mangas, levando a bordo sua inseparável câmara.
Ao conversar com amigos sobre o projeto, acolheu de pronto um dos conselhos que recebeu: o de nortear seus cliques por um recorte mais específico. E a escolha desse foco não foi nenhuma tarefa hercúlea: afinal, junto ao cinema, era a música a marcar presença em seu rol de predileções. E foi ela também a definir o sul dos Estados Unidos como região a ser perscrutada.
O resultado do olhar arguto de Poroger sobre a musicalidade inerente a Estados como Georgia, Tennessee, Mississippi, Louisiana e Texas poderá ser em parte conferido pelo público belo-horizontino a partir desta segunda (9), na exposição “Cold Hot”, que invade o Café com Letras Savassi, como parte da pré-programação do Savassi Festival 2018 (cujo início está previsto para 3 de agosto).
Insight
Na verdade, a viagem propriamente dita de Poroger aconteceu em 2014 – à época, foram 3.000 km percorridos em 17 dias. Das mais de 4.000 fotos tiradas, ele partiu para uma triagem e, ao final, 66 foram selecionadas para compor o livro “Cold Hot”, lançado no Brasil em 2016 e, no ano seguinte, em plagas norte-americanas. A exposição veio como um desdobramento natural dessa peregrinação pontuada por balizas memoráveis – uma delas, detectada por acaso, num banheiro.
“Fiquei hospedado em Clarksdale, no Mississippi, onde cabanas que, no passado, eram usadas pelos escravos para desencaroçar algodão, depois de anos abandonadas, hoje servem de pousadas, recebendo apaixonados por blues”, relata.
Como era inverno, no meio da noite, com frio, Sergio foi ao banheiro tentar se aquecer. E lá teve seu olhar cooptado pelas tradicionais placas que diferenciam as torneiras: “cold”, à esquerda, e, à direita, “hot”. Ocorre que, nesse momento, ele teve uma espécie de epifania. “Logo que vi essa imagem, falei: ‘Vai ser uma das mais importantes do livro, vai ser a capa, o título’”.
As palavras que sinalizam calor e frio comunicam exatamente o que ele vivenciou lá, o frio da estação e o calor emanado pelas pessoas, com o auxílio luxuoso da música. “Desde que aterrissei por lá me deparei com uma América diferente da que nós, brasileiros, estamos mais acostumados. Ela é bem diferenciada. Às vezes, há paisagens pobres e, mesmo sujas, é também uma região grandiosa, cheia de vida, com museus supermodernos. E as pessoas são mais alegres, o tempo corre mais devagar”, narra.
Ao voltar para o Brasil, já envolvido com o processo de seleção de imagens tocado junto ao curador, Eder Chiodetto, veio a ideia de usar a citada imagem “Cold Hot” para ocupar duas páginas que, em tese, dividem o livro. Na primeira parte, pois, estão as “imagens frias” e, na sequência, as “mais quentes”. “O quente dos bares, das garagens musicais, das pessoas namorando”, conta. O livro, vale lembrar, estará à venda no Café com Letras, a R$ 98.
Cold Hot, de Sergio Poroger
Café com Letras Savassi (r. Antônio de Albuquerque, 781). De 9/7 de julho a 12/8. Segunda a quinta, das 12 às 23h30, sexta e sábado, 12 à 1h, e, domingos, 17 às 23h. Entrada gratuita.