A derrota do deputado estadual Mauro Tramonte (Republicanos), que liderou a corrida para a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) até às vésperas da eleição, mas sequer foi ao 2º turno, põe em xeque o futuro do ex-prefeito Alexandre Kalil (sem partido) no Republicanos. A incerteza se dá em razão dos atritos internos colecionados por Kalil ao longo da campanha de Tramonte, de quem foi padrinho. Com apenas 15,22% dos votos válidos, o deputado estadual terminou em terceiro lugar.

Apesar de ter anunciado a filiação ao Republicanos ainda em julho, o ex-prefeito de Belo Horizonte, até agora, mais de dois meses depois, não está formalmente vinculado ao partido. De acordo com a certidão de filiação partidária de Kalil, o ex-presidente do Atlético apenas deixou o PSD desde o anúncio.  Procurado, o ex-prefeito afirmou que a intenção de se filiar está mantida, mas não informou quando irá ocorrer. 

Ainda durante a campanha, o ex-prefeito de Belo Horizonte chegou a projetar que a filiação poderia ocorrer ainda antes da eleição, no último domingo (6 de outubro). “Vou marcar com o Mauro (Tramonte)”, disse, em 24 de agosto, em uma agenda na região de Venda Nova ao lado do então candidato. Também presente, o presidente municipal do Republicanos e deputado federal, Gilberto Abramo, afirmou que a migração ocorreria no “tempo certo”.

Após perder o controle do diretório do Republicanos em Minas Gerais, Abramo, ao lado do ex-presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) Adalclever Lopes (PSD), foi o responsável por aproximar Kalil da candidatura de Tramonte. Em troca do apoio ao deputado estadual, o ex-prefeito de Belo Horizonte teria o controle da Executiva estadual a partir de novembro deste ano e seria o candidato do partido ao governo do Estado em 2026, o que já era visto como improvável internamente.

Entretanto, até Abramo teria tido divergências com Kalil, que teria assumido, nos bastidores, o papel de coordenador da campanha de Tramonte. O clima teria se acirrado na última semana, quando diversas pesquisas já apontavam, às vésperas do 1º turno, a tendência de queda do candidato. Os resultados teriam levado o presidente municipal do Republicanos a tentar corrigir os rumos da campanha, o que teria irritado Kalil

Até então, Abramo evitava interferir nas decisões tomadas pelo ex-prefeito de Belo Horizonte em razão do acordo que teria sido costurado para as eleições de 2026. Quando o deputado federal teria tentado ganhar espaço, Kalil não teria aceito, teria dito que o Republicanos dependia dele para eleger Tramonte e ainda ameaçado deixar a campanha. A postura do presidente municipal em intervir apenas na reta final da campanha teria incomodado integrantes da campanha, que avaliam que ele poderia ter reagido antes.   

O ex-prefeito de Belo Horizonte teria centralizado as decisões da campanha, sendo responsável por definir desde as agendas de rua de Tramonte até a preparação do candidato para os debates de TV e rádio. Por boa parte da campanha, Kalil acompanhava aos finais de semana o deputado estadual em vilas e favelas, consideradas, internamente, os locais onde o candidato era mais forte em razão da herança eleitoral do ex-prefeito.

Já durante a reta final, o mal-estar teria afastado Kalil até de Tramonte. Sem o ex-prefeito, o candidato acompanhou a apuração das urnas apenas ao lado da candidata a vice-prefeita Luísa Barreto (Novo). A princípio, havia a expectativa de que o ex-presidente do Atlético pudesse acompanhar o deputado estadual durante a votação, o que não ocorreu. Em um pronunciamento logo após o resultado, Tramonte sequer citou Kalil, se referindo apenas a Luísa. Os dois, segundo interlocutores, não teriam ainda se falado desde a apuração. 

A postura de Kalil, considerada “autoritária” por integrantes do Republicanos, também teria provocado um mal-estar com Luísa. Em determinada altura, a ex-secretária de Planejamento e Gestão do governo Romeu Zema (Novo) teria dito que não iria mais dirigir a palavra ao ex-prefeito para evitar conflitos. A candidata a vice-prefeita, que foi a coordenadora do plano de governo da chapa, deixou de fazer aparições ao lado de Kalil ao longo da campanha.

Luísa passou a ir em determinadas agendas sozinha, como, por exemplo, no encontro realizado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia com todos os candidatos à prefeitura individualmente. A candidata a vice-prefeita teria sido designada para agendas consideradas mais técnicas, que diziam respeito ao Plano Diretor e ao Código de Posturas, em razão do mau desempenho de Tramonte nos debates.   

Afastamento do governo Zema

A aparição de Luísa sozinha em compromissos de campanha já sinalizava o afastamento do governo Zema da campanha de Tramonte. Inicialmente, a estratégia era utilizar gradualmente a imagem do governador e, na reta final, explorá-lo na campanha. Entretanto, Zema não esteve em agendas públicas com o deputado estadual, nem apareceu nos programas veiculados no horário eleitoral gratuito na TV e no rádio.

A opção em deixar Zema de fora da campanha teria sido tomada pelo marketing. De acordo com pesquisas internas, a avaliação era que a imagem do governador traria maior rejeição a Tramonte do que a de Kalil em razão da má avaliação do Palácio Tiradentes em Belo Horizonte. Porém, internamente, a decisão teria sido questionada, já que havia a análise de que a campanha não precisava explorar o ex-prefeito porque o deputado estadual herdaria naturalmente os seus votos. 

Sem a imagem de Zema, a avaliação é que Tramonte teria perdido os votos que poderia ter, como, por exemplo, das classes A e B. À medida que o governador era escanteado e a campanha desidratava, o governo e o Novo teriam passado a blindá-lo para evitar que o desgaste recaísse sobre ele e, ainda, sobre o vice-governador Mateus Simões (Novo), que foi o responsável por bancar a articulação com o Republicanos.  

Filiação deixou de ser prioridade para o Republicanos

Passada a campanha, a filiação de Kalil sequer é tratada como prioridade pelo Republicanos. Em articulações que passam por Brasília, o partido considera prioritária a negociação pelo apoio no 2º turno ao nome do deputado estadual Bruno Engler (PL) em troca do embarque da bancada federal do PL na candidatura do deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB) à presidência da Câmara dos Deputados. 

Interlocutores de Kalil garantem que a filiação ainda ocorrerá, mas assim que o ex-prefeito voltar de uma viagem de descanso. No último domingo, após a apuração, o ex-presidente do Atlético afirmou que tiraria cinco dias para “passear de motocicleta”. “Estou muito cansado”, emendou ele, que não deve participar das discussões do Republicanos sobre quem apoiar no 2º turno de Belo Horizonte.

Posicionamentos

A reportagem de O TEMPO entrou em contato com o presidente municipal do Republicanos, Gilberto Abramo, e com o deputado estadual Mauro Tramonte, mas não obteve posicionamento até a publicação desta reportagem.

Por meio de nota, a ex-secretária de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto, afirmou que sua “relação com todos durante a campanha foi amena e respeitosa durante todo o tempo”.

Já o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil informou que está viajando e que na próxima semana estará à disposição. A assessoria de Kalil também foi procurada pela reportagem nesta sexta-feira (11 de outubro) e informou que, por conta da viagem, Kalil não poderia falar.