O TEMPO

O Rio em voga

Nos últimos dias, duas manchetes envolvendo a cidade do Rio de Janeiro atraíram a atenção para a segunda maior capital do país


Publicado em 09 de novembro de 2021 | 04:00
 
 
 
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Nos últimos dias, duas manchetes envolvendo a cidade do Rio de Janeiro atraíram a atenção para a segunda maior capital do país – ambas em contextos nitidamente embaraçosos.

O primeiro caso gera – ou deveria gerar – constrangimento para os nativos da Cidade Maravilhosa: foi lançado um livro-manifesto favorável ao movimento de “refederalização” do Rio de Janeiro. Trata-se de plataforma política construída em torno da ideia de se trazer de volta o status de capital do Brasil à cidade do Rio de Janeiro, em concomitância com Brasília. A proposta não se torna menos surreal diante do argumento de que há, no mundo, outros países com mais de uma capital nacional; tampouco colabora para a viabilidade do pleito o argumento de que o Rio é a cidade que mais comporta servidores federais no país.

Saudosos de uma glória que não vivenciaram, os defensores da ideia das duas capitais escancaram a motivação do movimento quando dizem querer desligar o Estado do Rio de Janeiro da cidade de mesmo nome, livrando-se da nunca reclamada responsabilidade sobre a administração estadual. Além de abrirem mão do território estadual – que não guarda nem uma fração do charme das praias da zona Sul carioca – os professores universitários e políticos que defendem a “refederalização” do Rio demandam recursos adicionais do governo federal, com o intuito de custear a pompa e circunstância que a nova capital do Brasil merece ter.

Ter mais recursos e menos responsabilidades é o pleito desavergonhado desse grupo de cariocas, comportando-se tal como um jovem que se cansa da vida adulta e quer de volta seu lugar no colo dos pais. Diante dos problemas do mundo real, defendem a fuga para a fantasia – a ser custeada por todos os brasileiros. Espera-se, no mínimo, que essa movimentação esteja causando constrangimento à maioria dos cariocas e fluminenses.

Para manter o Rio de Janeiro em voga, o secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais, Leônidas de Oliveira, declarou recentemente, em cerimônia com seu contraparte fluminense, que todo mineiro gostaria de ser carioca. Na tentativa de ser um anfitrião agradável, Oliveira achou que, para elogiar o próximo, deveria rebaixar a si mesmo e a seus conterrâneos; não apenas deu mostra de sua falta de preparo para o cargo que ocupa, como também constrangeu automaticamente 22 milhões de mineiros.

Orgulhoso de ser quem é, o mineiro não sente falta de diminuir qualquer que seja de seus conterrâneos para se autodefinir. Por isso, anular-se para agradar aos vizinhos soa estranho e antinatural; o elogio aos cariocas teria sido mais legítimo se não trouxesse qualquer condicionante. Afinal, mineiros e cariocas compartilham de uma tradição secular de cordialidade e relações amistosas.

Ao imputar a todos os mineiros sua baixa autoestima pessoal, o secretário Leônidas Oliveira garantiu seu lugar no anedotário político nacional – para deleite de outros vizinhos, cujo etos estadual implica necessariamente a desqualificação dos outros para a afirmação do próprio mérito.

 

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