Comissionados

Cabides de emprego sob risco

MP recomenda extinção da maioria dos cargos criados para nomear pessoas sem concurso

Por Queila Ariadne
Publicado em 11 de novembro de 2016 | 03:00
 
 
 
normal

A farra do cabide de empregos pode estar com os dias contados em Minas Gerais. Uma recomendação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) propõe a extinção de cargos comissionados irregularmente distribuídos, ou seja, aqueles que carregam a função de chefia no nome, mas não na prática. A orientação é direcionada à Prefeitura de Betim, mas pode servir de parâmetro para todos os municípios e se tornar uma arma estratégica para os novos prefeitos enxugarem a máquina.

Pela Constituição, um cargo comissionado – cargo de confiança – só pode ser dado a um trabalhador não concursado se estiver ligado a funções de chefia, direção e assessoramento. Mas, segundo o autor da recomendação, o assessor especial do procurador geral junto à Coordenadoria de Controle de Constitucionalidade, promotor de Justiça Marcos Pereira Anjo Coutinho, muitos gestores tentam driblar a lei e inventam nomenclaturas que trazem diretor ou assessor no nome, mas, na verdade, são cargos sem atribuição de chefia.

“Para se ter uma ideia de como esse problema é endêmico no Estado, 52% de todas as representações recebidas na coordenadoria estão relacionadas ao acesso inconstitucional a contratações e cargos comissionados na administração pública”, destaca Coutinho. Na avaliação do promotor, estimular a impessoalidade é um dos passos indispensáveis para a redução do patrimonialismo, desvinculando a definição dos cargos da troca de favores políticos. “Esse estímulo vai gerar o combate à corrupção”, ressalta.

“Sem dúvida é uma ótima oportunidade para os prefeitos eleitos, que estão assumindo agora, promoverem uma boa reforma administrativa e não terem tantos cargos políticos”, afirma o presidente da Comissão de Direito Municipal da OAB-MG, Leonardo Militão.

A prefeita eleita de Botumirim, no Norte de Minas, Ana Pereira Neta (PTC), afirma que, se o MP fizesse essa recomendação à cidade, viria a calhar. “É uma forma de incentivar o enxugamento da máquina. Tem que deixar de lado os compromissos políticos, porque, na verdade, o que precisa é ter eficiência no trabalho”, diz.

Betim. De acordo com o promotor, o caso de Betim não é nem o pior, nem o menos grave de Minas Gerais. Lá, a lei do plano de cargos é considerada irregular porque criou diversos cargos comissionados, como gerentes de unidades de saúde, diretores e vices de escolas e assessores. Entretanto, segundo avaliação de Coutinho, essas funções têm que ser técnicas e, portanto, ocupadas por efetivos.

Para cumprir a recomendação, a Prefeitura de Betim teria que revogar 1.211 dos 1.230 cargos comissionados existentes. “Ficariam apenas os agentes, como os secretários”, observa o coordenador da equipe de transição, Bruno Cypriano. O promotor questiona, por exemplo, cargos subdivididos em diretor I, diretor II e diretor III. Cypriano explica que variam de acordo com o tamanho de cada escola.

Segundo Coutinho, na fase de recomendação, a prefeitura pode procurar o MP para apresentar suas justificativas e ponderar, ou ainda modificar a redação da lei. “Não brigamos contra nenhum prefeito. A ré, aqui, é a lei. Por isso, damos a maleabilidade para a prefeitura decidir se vai revogar os cargos ou se vai substituir os comissionados por efetivos”, ressalta.

Consenso

Ajustes. A cada cem representações na Coordenadoria de Controle Constitucional, 52 são ligadas a cargos comissionados. Dessas, 20% têm solução consensual e não são judicializadas.


Reforma

União cortará mais de 10 mil comissionados

Há um mês, o governo federal publicou a Lei 13.346/2016, que converte 10.462 cargos comissionados de Direção e Assessoramentos Superiores (DAS) em cargos exclusivos de servidores concursados. Ao trocar esses cargos de confiança por efetivos, o governo estima que economizará cerca de R$ 230 milhões.

Segundo o Ministério do Planejamento, além de colaborar para o ajuste da situação fiscal do país, o principal impacto da medida é a redução de espaço para ocupação de cargos no governo por pessoas sem concurso. Outro objetivo é dar continuidade à política de valorização dos servidores públicos.

Com a conclusão da reforma administrativa, o total de cargos comissionados deve ser reduzido de 24,25 mil para menos de 11 mil cargos.

Atualmente, o governo federal possui 1,23 milhão de servidores ativos na administração direta e tem cerca de 19,9 mil cargos comissionados. Em 2015, eram 21,8 mil. (QA)

[infografico ID] 1.1397918 [/infografico ID]


Transição

Nova gestão pedirá mais prazo

A Prefeitura de Betim tem até o dia 21 de novembro para responder ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), sobre a recomendação do corte dos cargos de confiança, que chegou bem no meio da transição. A atual gestão, por meio de nota, diz que vai cumpri-la em tempo hábil. Já a equipe de transição afirmou que pedirá mais tempo para avaliar o pedido, que implica reforma da legislação para revogar os cargos comissionados ou, então, chamar efetivos para funções gratificadas.

O presidente da Comissão de Direito Municipal da OAB-MG, Leonardo Militão, explica que, como o caráter é ainda de recomendação, e não de imposição, a prefeitura pode pedir a dilatação do prazo. “Neste primeiro momento, existem muitas outras prioridades que vão além do plano de cargos. Então, a prefeitura pode pedir mais um tempo. Entretanto, ela deve se manifestar, para indicar ao Ministério Público que, embora a irregularidade tenha acontecido na gestão anterior, ela está preocupada”.

O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Toninho Andrada, afirma que cada prefeitura tem uma situação diferente e deve ser avaliada separadamente. “A questão do cargo de confiança é muito complexa, pois é mais administrativa do que jurídica”.

O promotor de Justiça Marcos Pereira Anjo Coutinho afirma que a dilatação do prazo só poderá ser avaliada quando o Ministério Público receber alguma manifestação da Prefeitura de Betim. Mas sinalizou que está aberto para conversar. “Essa fase de recomendação é um momento de ponderação. Agora, se não houver uma solução satisfatória para corrigir a lei, então vira uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)”, afirma. (QA / Fransciny Alves)

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!