Doorgal Andrada

Buser e o direito de escolha do cidadão

Proteção à vida e proteção à livre iniciativa inspiram debate


Publicado em 03 de setembro de 2021 | 03:00
 
 
 
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Vivemos um tempo de mudanças aceleradas, no qual a tecnologia impacta a existência humana desde a forma como nos comunicamos até o que podemos vislumbrar, por exemplo, como fontes de energia ou meios de transporte. Obviamente, a humanidade vem evoluindo desde sempre, seja no desenvolvimento de ferramentas, seja na capacidade de abstração e criação. A diferença é mesmo a velocidade das mudanças. Ocorre tanto com produtos que se tornam obsoletos e são substituídos, como os CDs, quanto com aqueles que agregam cada vez mais tecnologia e funções, caso dos celulares.

Essa marcha da humanidade é inevitável, inclusive em virtude do próprio espírito humano, da curiosidade e da busca por transformar as coisas. Parte desses avanços é absorvida naturalmente, entrando no cotidiano de cada um de nós de maneira sutil e amigável. Outras, ao contrário, representam a ruptura de paradigmas, hábitos e sistemas já enraizados, o que torna o processo mais conturbado e, por vezes, doloroso.

Na própria Assembleia Legislativa, o advento da pandemia de Covid-19 antecipou uma inovação que exigiu esforço tecnológico e capacidade de adaptação dos servidores da Casa e dos parlamentares. Falo das sessões remotas das comissões e do plenário. Se fôssemos questionados, em janeiro de 2020, se esse método seria válido, prático e possível, dificilmente haveria consenso ou maioria favorável. Hoje, trabalhamos em sistema misto, e, mesmo com o lado negativo da distância física, o resultado é a possibilidade de um maior dinamismo da atuação parlamentar. Pode-se, por exemplo, participar das sessões mesmo na impossibilidade da presença em plenário por adversidades, discutindo, encaminhando e votando em tempo real.

Entre os avanços que geram a ruptura de sistemas enraizados, creio que o advento dos aplicativos de transporte e entregas seja dos mais representativos e relevantes no cotidiano do cidadão. Primeiro, foram os apps como Uber e iFood. Agora, surgem outros, como o Buser, que passam a estender o serviço tecnológico a um coletivo. Nos dois casos, a tecnologia possibilita a inovação em setores absolutamente consolidados, cuja atividade e regulamentos estão sedimentados há décadas.

De forma repentina, os aplicativos trouxeram flexibilidade, conforto e preços menores para os consumidores, mas trouxeram também a reação contrária daqueles que já haviam se estabelecido. Devemos ser honestos em dizer que enfrentamos um tortuoso dilema, uma vez que o Estado regulamenta de forma a exigir deveres daqueles serviços, como, por exemplo, idade da frota, adaptação para pessoas com deficiência, gratuidades, seguros e direitos dos passageiros, exigências ainda esquivadas por tais aplicativos. Daí se inicia um grande debate, que resultou, inclusive, em uma fervorosa discussão e votação, nesta semana, no Parlamento mineiro.

Assim, seja qual for o avanço tecnológico ou comportamental, é preciso garantir a proteção ao cidadão e à sua vida acima de tudo. E, ainda, a proteção à livre iniciativa, ao livre mercado e, principalmente, ao direito de escolha dos cidadãos.

É com esses princípios em mente que passamos a tomar uma decisão de alta complexidade, especialmente para aqueles que prezam a racionalidade e o discernimento e ponderam na busca por justiça. Diante de tudo isso, não considerei adequado o caminho de inviabilizar o aplicativo Buser e similares por meio do projeto de lei recém-votado, pois seria um desestímulo a novas tecnologias permitir que o Estado interrompa as atividades daquilo que ainda não teve capacidade de regulamentar.

Acredito que ainda nos resta muito debate para atingir o melhor resultado, no entanto, diante do atual confronto dos gigantes, “aplicativo não regulamentado” versus “tradicionais empresas de ônibus”, optei por garantir o direito de escolha do cidadão!

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