O ex-presidente da Light, Luis Paroli Santos, disse nesta terça-feira (26) que a venda da participação da empresa na Renova por R$ 1 no final de 2019 não era a melhor solução e que havia outras opções para resolver os problemas financeiros da companhia.
Paroli prestou depoimento à CPI da Cemig nesta terça-feira (26). Ele foi presidente da Light, empresa que detém a concessão de energia em municípios do Rio de Janeiro, entre 2017 e abril de 2019.
A Cemig era a controladora da Light com 49,9% das ações, mas vendeu 27,3% em julho de 2019, e os 22,6% restantes em janeiro de 2021.
Em novembro de 2019, sete meses depois de Paroli deixar a presidência da Light, a empresa fluminense, ainda com participação da Cemig, vendeu por R$ 1 os 17,17% de ações que detinha na Renova, empresa que atua no ramo de energia eólica, a um fundo de investimentos.
Dois dias depois da venda, a Renova entrou com um pedido de recuperação judicial por não conseguir pagar as dívidas no valor de R$ 3 bilhões.
Além da participação indireta que tinha via Light, a Cemig ainda detém 27% das ações com direito a voto na Renova e integra o bloco de controle da empresa. A estatal é a maior acionista individual, segundo o site da Renova.
Os deputados mostraram a Paroli durante o depoimento uma apresentação interna de slides da Cemig, datada de janeiro de 2019, já no governo Zema mas meses antes da venda e do pedido de recuperação judicial, em que são apresentadas sete alternativas para tentar solucionar os problemas financeiros enfrentados pela Renova, como venda de ativos e refinanciamentos da dívida.
A venda por R$ 1 não era uma das opções. Perguntado se essa seria a melhor solução, Paroli afirmou que não teve acesso aos dados da Renova no momento da venda, já que não era mais presidente da empresa quando a operação financeira ocorreu, mas que não concordava com o caminho adotado.
“No momento em que eu dirigi a Light, eu não entendia essa solução [venda da participação na Renova por R$ 1] como a melhor para a empresa. Tanto que eu não a exerci e não a coloquei em prática”, respondeu.
“A Renova tinha várias opções, todas tinham prós e contras, mas tinha opções. Tanto que a Renova existe até hoje e as ações estão na Bolsa”, disse Paroli, que informou que atualmente cada ação da Renova vale R$ 8,33 e o valor de capitalização na Bolsa de Valores é de R$ 480 milhões.
Ele declarou ainda que, por ter indicado a maioria dos conselheiros da Light, a Cemig poderia, em tese, não aprovar a venda da participação da empresa fluminense por R$ 1 caso não concordasse com a operação.
Procurada, a Cemig disse que não vendeu sua participação na Renova e que quem efetuou operação nesse sentido foi a Light, na qual teve participação até janeiro de 2021.
A estatal negou que tivesse poderes para impedir a venda da participação da Light na Renova por R$ 1 por meio de seus conselheiros na empresa.
"Quando da referida venda, a Cemig tinha três dos nove representantes no Conselho de Administração (CA) da Light, entre eles o Sr. Cledorvino Belini. Em atendimento às boas práticas de governança, eles se abstiveram de votar após se declararem impedidos por conflito de interesses. Isso porque, após a votação no CA da Light, um eventual direito de preferência da Cemig teria que ser votado no CA da própria Cemig. Essa razão foi exposta e documentada em reunião na Light", disse a Cemig em nota.
Paroli não foi o único a não concordar com a venda da Renova por R$ 1. O ex-presidente da Cemig, Cledorvino Belini, relatou à CPI que renunciou ao cargo de conselheiro da Light depois do Conselho de Administração ter aprovado a operação financeira. Ele disse que se sentiu desconfortável com a decisão.
A CPI da Cemig aprovou um requerimento para que a Light envie à comissão a cópia da ata da reunião que aprovou a venda da participação na Renova, assim como uma lista dos conselheiros responsáveis pela decisão e eventuais manifestações contrárias à operação.
A Light foi procurada, mas ainda não se posicionou. Esta matéria será atualizada com a resposta.
Deputados criticam operação e, como ironia, fazem “leilão” da Renova
A venda da participação da Light na Renova por R$ 1 recebeu críticas da maior parte dos parlamentares que integram a CPI da Cemig. Vice-presidente da comissão, o oposicionista Professor Cleiton (PSB) disse que é preciso entender o que aconteceu.
“Nos intriga a venda da Renova por um real. Não entra na minha cabeça. A Renova tinha salvação?”, questionou. “Temos que chegar aqui à conclusão de quem fez essa opção pela venda. O ex-presidente Belini disse que ele não concordou com isso”, acrescentou Cleiton.
O relator da CPI, Sávio Souza Cruz (MDB), disse que a responsabilidade pela negociação, em última instância, é dos conselheiros da Light. “Mas [a responsabilidade] tem que ser imputada a quem tinha competência de indicar os conselheiros comprometidos com os interesses da empresa e preferiu indicar pessoas, entre aspas, do mercado”, declarou, em referência à Cemig.
Em um momento de ironia, o relator fez uma proposta para comprar a Renova. “Quero falar aos compradores: eu pago 100% de lucro. Pago dois reais à vista. Pode me procurar, estou disponível aqui na Assembleia. Um grande negócio, estou publicamente propondo aos compradores da Renova. Pago 100% de lucro, a inflação não chegou a isso. Não tem melhor condição. Se quiser pago em espécie, tenho na carteira uma nota de dois reais. Senhores compradores, vocês compraram pelo preço justo de um real e têm a chance de ter 100% de lucro”, disse Sávio Souza Cruz (MDB).
Em seguida, o presidente da comissão, Cássio Soares (PSD) também ironizou. “Se for leilão, eu estou disposto a pagar cinco reais. 500% de lucro”. “Eu pago 13 reais”, disse a deputada Beatriz Cerqueira (PT).
Zé Guilherme defende venda da Light
O deputado Zé Guilherme (PP), integrante da base de governo, lembrou que Luis Paroli foi indicado para a presidência da Light na gestão de Fernando Pimentel (PT) , o que o deputado considerou natural pelo fato do petista ter vencido as eleições. “É assim que funciona”, afirmou.
Durante a reunião, Paroli disse que é filiado ao PT desde o final dos anos 90, mas que não participa das atividades partidárias.
Zé Guilherme justificou a decisão da Cemig de se desfazer das ações na Light. Segundo ele, a Cemig arrecadou R$ 2,2 bilhões com a venda da participação na empresa fluminense, mais R$ 636 milhões em créditos tributários e deixou de gastar R$ 1,6 bilhão em aportes que teria que fazer na Light, totalizando R$ 4,4 bilhões de impacto positivo no caixa da estatal.
“Essa venda representa o espírito atual da Cemig: focar em Minas Gerais. A Cemig não deve e não pode gastar seu tempo com o Rio de Janeiro ou onde quer que seja. A Cemig tem que estar 100% focada em melhor atender aos clientes mineiros”, afirmou.
"A Cemig parou de queimar no Rio de Janeiro para botar em Minas Gerais. É sempre difícil reconhecer que foi feito um mau negócio: é exatamente isso que é a Light. Um péssimo negócio para a Cemig”, acrescentou o parlamentar.
Matéria atualizada às 13h36 para incluir posicionamento da Cemig e informações sobre a participação acionária da empresa na Renova