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Governo Bolsonaro veta médico que criticou cloroquina como chefe do PNI

O pediatra iria assumir o cargo no lugar de Francieli Fontana, enfermeira e servidora da Saúde que pediu demissão no fim de junho

Por Folhapress
Publicado em 28 de outubro de 2021 | 21:02
 
 
 
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O pediatra Ricardo Queiroz Gurgel não irá assumir a coordenação do PNI (Programa Nacional de Imunizações). Ele foi nomeado para o cargo em 6 de outubro, mas não chegou a tomar posse.

Segundo Gurgel, ele decidiu ir para Brasília nesta quinta-feira (28) para entender por que ainda não havia sido chamado para assumir a pasta que está sem comando há quase quatro meses. Ao chegar ao Ministério da Saúde, soube que estava fora dos planos do governo.

"Eu queria uma definição se eu iria assumir ou não porque tenho vida para assumir, sou pesquisador e professor. Imagino que não foi problema no meu currículo, mas não sei o motivo de não assumir. Isso só o ministro pode dizer", disse.

O pediatra levanta bandeiras opostas às do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o médico afirmou ser favorável à vacinação de crianças e adolescentes, criticou fake news sobre a campanha de imunização e disse que está "suficientemente comprovado" que medicamentos do "kit Covid" não têm eficácia.

Gurgel afirma ainda que teve apenas uma conversa com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, quando foi convidado ao cargo no PNI. O ministro, disse Gurgel, não voltou a telefonar após a nomeação.

O médico disse ainda que foi recebido no Ministério da Saúde nesta quinta por um subordinado do secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Medeiros. Este funcionário teria informado que não há chances de Gurgel virar chefe do PNI, mas sem entrar em detalhes.

O pediatra iria assumir o cargo no lugar de Francieli Fontana, enfermeira e servidora da Saúde que pediu demissão no fim de junho. Ela disse à Folha de S.Paulo, ao deixar o PNI, que falas de Bolsonaro dificultam a campanha de imunização.

Apoiadores do presidente moveram campanha nas redes sociais contra a nomeação de Gurgel ao PNI. Argumentaram que ele e sua esposa, que fez publicações críticas ao governo Bolsonaro na internet, não estavam alinhados com o presidente.

As queixas chegaram ao Planalto. A equipe de Queiroga foi informada que a Casa Civil barrou a ida de Gurgel ao cargo.

O pediatra afirma que se desvinculou da Universidade Federal de Sergipe para assumir o comando do PNI, mas nem sequer recebeu instruções do ministério sobre como assumir o cargo, montar equipe ou acessar o email funcional.

Ele disse que não sabe se receberá salário pelo período em que esteve nomeado no governo Bolsonaro. Declarou também que pediu para ser imediatamente exonerado.

Queiroga vive o pior momento no cargo. Isolado entre gestores do SUS, o ministro ainda é pressionado pelo presidente e apoiadores que fazem campanha contrária à vacinação.

Gurgel não é o primeiro escolhido de Queiroga que é derrubado por se opor a pautas negacionistas. A médica Luana Araújo, anunciada em maio para o cargo de secretária de Enfrentamento da Covid-19 do Ministério da Saúde, foi dispensada dez dias depois.

A médica Rosana Leite de Melo assumiu o cargo após Luana ser mandada embora. As principais decisões sobre a imunização da Covid estão nas mãos da secretária. Caberia a Gurgel decidir sobre campanhas de outras doenças, como da gripe.

Em setembro, Rosana assinou orientação de suspender a vacinação de adolescentes, mesmo com aval da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para aplicar doses da Pfizer no grupo de 12 a 17 anos. Ignorada por gestores do SUS, a orientação caiu na semana seguinte.

Ao ser anunciado para o PNI, Gurgel declarou à Folha de S.Paulo que a controvérsia sobre vacinar os mais jovens estava superada. "Realmente, é seguro e útil que a vacinação em adolescentes seja feita", disse o pediatra.

O ministro Queiroga ainda tentou, no começo de sua gestão, mas não conseguiu demitir nomes que agradam à base bolsonarista, como o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Hélio Angotti.

Trata-se de médico defensor do chamado "kit Covid" que participou de viagem do governo a Israel para conhecer o spray nasal contra a Covid.

Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria, Gurgel é formado em medicina pela UFS (Universidade Federal de Sergipe), onde é professor.

Ele também cursou doutorado em saúde da criança e do adolescente na USP (Universidade de São Paulo).

O Ministério da Saúde foi procurado, mas não retornou até o momento.

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