Barragens

Governo de Minas veta trechos de lei que instituía política para atingidos

Parte do projeto que previa inclusão de plano de recuperação no licenciamento foi rejeitada pelo governador Romeu Zema

Por Pedro Augusto Figueiredo
Publicado em 19 de janeiro de 2021 | 06:00
 
 
 
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O governador Romeu Zema (Novo) vetou três artigos da Política Estadual dos Atingidos por Barragens (Peab) em Minas, projeto de lei que havia sido aprovado na Assembleia Legislativa (ALMG) em dezembro.

O restante do texto foi sancionado, conforme publicação na edição do Diário Oficial “Minas Gerais” do último sábado.

A Peab garante que o Estado prestará assistência social para os atingidos por barragens, detalha o que é considerado uma barragem e as formas como o prejuízo da população pode se dar, como a perda de um terreno ou a perda de uma área para pesca.

De acordo com o texto, a assistência deverá ser prestada antes, durante e depois da instalação e manutenção das barragens. O projeto original é do deputado Elismar Prado (PROS) e do agora deputado federal Rogério Correia (PT).

O principal instrumento da nova lei é a elaboração do Plano de Recuperação e Desenvolvimento Econômico e Social (PRDES) para cada barragem. O PRDES vai conter as ações a serem tomadas e os custos estimados para a reparação integral de impactos socioeconômicos causados por “construção, instalação, operação, ampliação, manutenção ou desativação de barragens”.

Na prática, o plano vai prever as ações a serem tomadas e os custos da reparação quando houver algum dano causado à população pelas barragens, como nos desastres de Mariana e Brumadinho. Quem vai monitorar o cumprimento das ações em cada barragem será um comitê paritário formado por integrantes do poder público e representantes dos atingidos por barragens.

Passos.

O texto aprovado na ALMG previa que esse plano de recuperação fosse apresentado pelas empresas no processo de licenciamento ambiental, a exemplo do que é feito com as barragens hídricas. No caso desse tipo de barragem, o licenciamento ambiental para a instalação só é concedido se o Conselho Estadual de Assistência Social aprovar um plano de assistência social às pessoas afetadas pelas áreas inundadas para formação do reservatório.

A proposta aprovada pelos deputados estendia a mesma exigência para todos os tipos de barragem, inclusive as de mineração.O governador Romeu Zema vetou esse artigo sob a justificativa de que o PRDES já passaria pela aprovação do órgão ambiental antes da emissão da licença ambiental.

“O PRDES já integraria o processo de licenciamento ambiental dos empreendimentos. Isso ocorreria em razão da representatividade e da participação dos diversos atores públicos, privados e sociais, além da sistemática de estudos e análises realizadas durante o processo de licenciamento ambiental. Dessa forma, a aprovação do PRDES depende de manifestação do órgão ambiental, e, consequentemente, a emissão da licença ambiental seria precedida desse processo”, escreveu o governador na justificativa ao veto.

O governo não respondeu se não seria mais eficiente deixar explícito que a emissão da licença está condicionada à aprovação do PRDES.

Obrigação e ônus de prova barrados

 O governador Romeu Zema também vetou um trecho que determinava que seria direito dos atingidos por barragem a inversão do ônus da prova. 

Normalmente, cabe a quem acusa apresentar provas que embasam as acusações. Mas, em relação às barragens, esse dispositivo vetado significava que, em um eventual rompimento, por exemplo, caberia à empresa responsável provar que não houve danos. 

A justificativa do governador para o veto é que o artigo era inconstitucional e que somente um juiz poderia conceder o direito à inversão do ônus da prova conforme o caso analisado.

O último ponto vetado é o que determinava que as barragens já existentes poderiam ser obrigadas a apresentar um plano de recuperação. Zema considerou o artigo inconstitucional porque atentaria contra o princípio da segurança jurídica, já que quando as barragens receberam o licenciamento não havia essa exigência. 

'São muito ruins', diz deputado

O deputado estadual João Vítor Xavier (Cidadania), que atuou para a aprovação do Projeto de Lei Mar de Lama Nunca Mais, considerou os vetos de Zema “muito ruins” e disse que Minas perde com isso.

“Normalmente, os atingidos por barragens são pessoas muito simples, pessoas que vivem em comunidades rurais, como Bento Rodrigues. E pessoas em sua maioria hipossuficientes (neste caso, que não têm capacidade e conhecimento jurídico mínimo para se defenderem), ainda mais quando se trata de briga com grandes empresas do setor minerário. E os vetos impactam diretamente os direitos dessas pessoas e as prevenções para o enfrentamento dessas pessoas com os gigantes desse setor. Nós só podemos lamentar a decisão do governador”, disse.

Ele criticou especialmente o veto ao trecho que prevê que o plano de recuperação seja incluído no licenciamento ambiental.

“Até porque a gente já trata dessa questão no Projeto Mar de Lama Nunca Mais, que virou lei, que também dá essa garantia de que os atingidos ou as áreas de autossalvamento sejam contemplados no licenciamento. Então, isso seria uma política reafirmativa dessa questão, que é muito importante”, explica.

A Assembleia pode derrubar os vetos do governador. Para isso, é necessário o voto da maioria dos deputados, o equivalente a 39 parlamentares. De acordo com o líder do bloco Liberdade e Progresso, deputado Cássio Soares (PSD), a análise será feita com rigor.

“Se entendermos que os vetos foram adequados, temos uma tendência forte de mantê-los. Mas fato é que nós temos que dar respostas eficientes e duras quanto aos empreendimentos de barragens em Minas Gerais para evitarmos que novos desastres, tragédias e crimes ambientais e humanitários sejam provocados por irresponsabilidade de empreendedores”, disse o deputado. 

 

 

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