PANDORA PAPERS

Guedes sobre offshore: 'Aquilo é da família, mas não há conflito de interesse'

Ministro da Economia foi convocado à Câmara dos Deputados para esclarecer investimentos em paraíso fiscal

Por Luana Melody Brasil
Publicado em 23 de novembro de 2021 | 09:46
 
 
 
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O ministro da Economia, Paulo Guedes, compareceu à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (23) para esclarecer a suspeita de conflito de interesses no caso da offshore em paraíso fiscal, revelada pela investigação jornalística Pandora Papers em 3 de outubro deste ano.

Guedes foi convocado pelos deputados Kim Kataguiri (DEM-SP), Paulo Ramos (PDT-RJ), Elias Vaz (PSB-GO) e Leo de Brito (PT-AC) para explicar suas movimentações financeiras no exterior. Na última convocação, marcada para 10 de novembro, o ministro não compareceu sob a justificativa de estar em viagem oficial acompanhando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).  

Em sua defesa, o ministro disse que não há conflito de interesse no caso da offshore porque ele vendeu suas propriedades para assumir a chefia do ministério. “Não há conflito de interesse. É informado aos órgãos competentes, é 100% legal, é declarado à Receita Federal todo ano, tudo é informado ao Banco Central e à Comissão de Ética da Presidência”, esclareceu o ministro. 

Ele disse ainda que desinvestiu em suas propriedades a conselho de seus advogados, mas que “por razões sucessórias”, tem um representante familiar que é informado sobre as movimentações da conta, “porque se eu morrer, aquilo é da família”. 

Explicando a offshore, o ministro sugeriu que é uma saída para que o Estado não fique com todo o patrimônio familiar em caso de morte, mas usou como exemplo o regramento dos Estados Unidos, e não brasileiro. 

"Nos Estados Unidos, se você tiver uma conta em nome da pessoa física e falecer, 46%, 47% é expropriado pelo governo americano. Todo o seu trabalho de vida, em vez de você deixar para um herdeiro ou para algum familiar, vira imposto sobre herança e é apropriado pelo governo americano", disse Guedes.

Na sequência, acrescentou a justificativa: "Então, o melhor é usar uma offshore.  Isso é que explica você botar um parente, botar um filho, botar um parente, uma mulher". 

Sobre a variação do câmbio, o ministro argumentou que se quisesse interferir no preço do dólar, teria mantido sob o seu comando o Banco Central – que é independente e presidido por Roberto Campos Neto, cuja offshore em paraíso fiscal também foi revelada pela investigação Pandora Papers. 

“A independência é um ato de desprendimento, de despolitização da moeda. Não controlo a taxa de câmbio”, disse, acrescentando que a offshore é controlada por gestores independentes, que ele mesmo e sua família não conhecem. “São recursos da minha família transparentes e declarados. Não há conflito de interesse porque os órgãos têm acesso a essas informações”, reforçou. 

O que diz a legislação?

As offshores são empreendimentos ou contas bancárias abertas fora do país de origem do proprietário. Abrir uma offshore ou contas no exterior não é ilegal, desde que seja declarada aos órgãos de fiscalização, como Receita Federal e Banco Central.

Por outro lado, o deputado Kim Kataguiri lembrou que, segundo a legislação, é vedado o investimento em bens cujo valor pode ser afetado por decisão ou política governamental. “O Sr. afirmou que desde que entrou no Ministério se afastou dessas aplicações. Considerando que os acionistas são familiares, o eventual controle por eles não torna inócuo o seu afastamento?”, questionou o deputado. 

Kataguiri se referiu ao artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, instituído em 2000, que proíbe funcionários do alto escalão, como é o caso de Guedes, de manter aplicações financeiras, no Brasil ou no exterior, passíveis de ser afetadas por decisões deles mesmos ou por políticas governamentais. 

Essa proibição não vale para toda e qualquer política oficial, mas especificamente sobre aquelas nas quais “a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função”. 

Por sua vez, o deputado Vaz trouxe o documento da Comissão de Ética que o ministro assinou declarando que não há conflito de interesse no momento de assumir o cargo no ministério e mostrou distorções. “Como o Sr. declarou ‘não’? A sua filha é sócia, sua esposa é sócia. Quem está faltando com a verdade é o Sr. quando declarou ‘não’”, provocou o deputado.

Offshore milionária no Caribe 

A offshore vinculada à família de Guedes é a Dreadnoughts International, localizada nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal no Caribe, com aporte equivalente, atualmente, a mais de R$ 50 milhões. De acordo com a investigação do consórcio jornalístico, o ministro assumiu o cargo na Economia cinco anos depois de abrir essa offshore. 

Guedes é o principal fiador do governo Bolsonaro, tendo sob sua alçada decisões que podem afetar seus negócios no exterior. Nesse sentido, considerando a cotação do dólar quando assumiu o posto e atualmente, o ministro lucrou pelo menos R$ 14 milhões, caso o dinheiro tenha ficado parado na conta do paraíso fiscal.

Uma decisão tomada por Guedes e Roberto Campos Neto já no governo Bolsonaro levantou suspeitas. Eles foram responsáveis diretos pela alteração das regras para donos de offshores.

A decisão, tomada no âmbito do Conselho Monetário Nacional (CMN), elevou o limite do valor depositado no exterior que precisa, obrigatoriamente, ser declarado.

Esse conselho é composto por três autoridades: o ministro da Economia (presidente do Conselho), o presidente do Banco Central e o secretário Especial de Fazenda do Ministério da Economia.

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