Igor Eto

Pelo direito dos idiotas

Estamos dispostos a respeitar a liberdade dos outros?

Por Igor Eto
Publicado em 26 de outubro de 2022 | 03:00
 
 
 
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Queremos liberdade para ir, vir e nos expressar, mas ser livre tem um preço. Se queremos ser livres, precisamos defender a liberdade alheia. O ex-premiê britânico Winston Churchill dizia que “a democracia é o pior forma de governo; à exceção de todas as demais”. Parte da crítica irônica de Churchill diz respeito ao fato de a democracia nos exigir tolerar a opinião do outro, ainda que discordemos dela. 

Todo mundo pensa que o princípio basilar da democracia é a decisão da maioria. Mas, mais importante que o senso de grupo, o princípio básico da democracia é o direito de termos voz, de termos vez. E, ainda que a decisão democrática seja reflexo do desejo da maioria, a minoria tem resguardado o direito de criticar, de se opor e de tentar mudar a opinião da maioria. 

O direito de discordar, inclusive, é o ponto mais importante da democracia por um motivo simples: nem sempre estaremos ao lado da maioria. E aqui é importante fazermos uma distinção entre opinião e fato.

Sempre que abordo o tema democracia para um grupo de pessoas, afirmo que o Cruzeiro é o maior clube de Minas. Isso basta para começar um frisson na sala de aula ou no auditório. Parte dos ouvintes discorda, e iniciamos uma saudável discussão, em que apresento fatos para defender a minha opinião. Digo que o Cruzeiro é o maior clube de Minas porque tem três vezes mais Copas do Brasil que o Atlético e o dobro de títulos de Campeonato Brasileiro e Libertadores.

Mas o ponto aqui é: apesar de eu trazer fatos para sustentar o argumento, ainda estou defendendo apenas a minha opinião. E opinião não tem certa ou errada. Podemos discordar e tentar argumentar de forma contrária. Podemos achar que aquela opinião é uma idiotice. Mas não podemos proibi-la sob o risco de, amanhã, a opinião proibida ser a nossa.

E aqui entramos em uma discussão sobre os limites da liberdade de expressão. Esses dias, fiz uma postagem sobre uma célebre frase do filósofo Voltaire que afirma: “Discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”. Logo após a postagem, disseram que eu não “poderia usar o nome de Voltaire em vão” (Voltaire é santo?) ou “para defender um genocida como Bolsonaro”. 

Como liberal, o texto era uma defesa árdua da liberdade de expressão, e não de candidato A ou B, mas vou usar a associação para defender meu ponto de vista. Quem chama Bolsonaro de “genocida” está de acordo em ser proibido de chamá-lo assim? Afinal, não existe processo formal, muito menos condenação do presidente por genocídio.

E defender que um órgão censure previamente a opinião de alguém? Mais perigoso ainda. Imagine aonde isso pode chegar. Quais as consequências desse ato? Amigos, a Justiça serve para julgar disputas em casos concretos e objetivos. Dar uma “carta branca de cala boca” para alguém é um passo sem retorno para o fim da liberdade individual. 

Como sou menos polido que o “santo Voltaire”, digo: posso achar sua opinião uma idiotice, e você pode achar o mesmo da minha. Mas sigo lutando para que tenhamos nossa liberdade de expressão garantida. Defendo, inclusive, a liberdade de ser um idiota que acha certo censurarmos quem pensa diferente de nós.

Igor Eto é administrador

 

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