MATEUS SIMÕES

Aprovado o 'Dia Municipal do Jazz': não falta mais nada

Logo faltarão datas para tantas comemorações inúteis


Publicado em 15 de abril de 2019 | 03:00
 
 
 
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Belo Horizonte tem um “Dia da Feijoada”, que eu sempre achei que fosse sábado, mas é 18 de maio, por lei! Tem também o carinhoso “Dia do Vovô”, o alternativo “Dia do Skate”, o inusitado “Dia da Luta de Braço” e até o fúnebre “Dia do Coveiro”.

Logo no começo de meu mandato, votei contra a criação do “Dia Municipal de Atenção à Pessoa com Lúpus”. Perguntaram se eu tinha algo contra os doentes de lúpus… Vou mudar a pergunta: no que a vida de alguém com lúpus melhorou desde a aprovação da data?

A criação de dias é mais uma das inúmeras formas de homenagens que a Câmara insiste em prestar – e minha contínua implicância com essas homenagens diz respeito ao custo dessas bobagens. São nomes de rua, títulos de honra ao mérito e de cidadão honorário, medalhas e colares, dias comemorativos e uma série de providências que mobilizam o Legislativo e sua estrutura milionária para atender o lobby de um setor, agradar um amigo ou conquistar um eleitorado com um afago de ego que custa para a cidade.

A Câmara Municipal gasta R$ 20 milhões por mês do dinheiro dos impostos pagos por quem trabalha e vive por aqui e, há anos, mais da metade de tudo o que produz são essas quinquilharias.

Pouco esforço de fiscalização das contas públicas, quase nenhum acompanhamento dos grandes projetos da cidade, uma participação lateral nas discussões legais de uma Câmara que, quando aprova algo de relevante, recebeu o projeto pronto do Executivo e apenas homologa o que lhe foi encaminhado.

Gosto de jazz, mas não votei a favor da criação do “Dia do Jazz”, aprovado em segundo turno na última semana, pela Câmara Municipal. O meu voto foi o único contrário. Não contarão com a minha ajuda para esse movimento de “chacoalhar folhas para parecer que há vento”. A verdade é simples: a Câmara não tem se justificado, em termos de custo. Os vereadores, atuais ou os que estão por vir, precisam assumir com seriedade a sua função de fiscalização e protagonizar as grandes discussões da cidade – como a revisão de nosso Código de Posturas, que precisa desesperadamente de uma reestruturação, em vez de ser remendado a cada momento em que um amigo do poder tem uma necessidade específica.

No mesmo dia em que o Dia do Jazz foi aprovado, outros três projetos estavam na pauta: (1) proibição do uso de carroças em Belo Horizonte, o que impacta a realidade de 3.000 carroceiros profissionais da cidade, numa discussão que envolve subsídio público a essa atividade e maus-tratos a animais – mas o projeto não foi votado; (2) uma alteração no Código de Posturas da cidade para viabilizar a instalação de publicidade de grande porte e placas de grandes dimensões em hotéis e hospitais, criando uma exceção às restritivas regras que valem para o restante do comércio, sem uma discussão completa do código – o projeto também não foi votado; e (3) uma autorização para que o prefeito possa fazer contratações sem concurso para vagas de necessidade contínua, em clara burla à regra constitucional que estabelece o concurso como única forma de preencher essas vagas – proposta aprovada sem uma discussão mais aprofundada num movimento típico de aprovar tudo o que a prefeitura pede.

Com tantos temas centrais, a Câmara optou por discutir e aprovar a lei que cria o “Dia do Jazz”. Parabéns ao autor: ele demonstrou de forma clara que Belo Horizonte precisa rever urgentemente o que espera de sua Câmara Municipal. Ou logo faltarão dias para que tantas comemorações inúteis possam ser feitas.

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