Drama

Orçamento Participativo de BH tem centenas de obras paradas

Moradores de regiões afetadas por problemas históricos seguem esperando cumprimento de promessas

Por Fransciny Alves
Publicado em 23 de janeiro de 2018 | 03:00
 
 
 
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Pela janela de casa, dona Geralda Monteiro, 65, se entristece ao ver diariamente a rua, no bairro Tupi B, na região Norte de Belo Horizonte. Esgoto a céu aberto, matagal e insetos fazem parte de sua rotina. A 10 km dali, no bairro Aparecida 7ª Seção, na região Noroeste da capital, a situação não é muito diferente. O aposentado Valter Eustáquio, 64, resume a situação: “Aqui, os ratos batem nos gatos”. Para mudar o cenário, moradores desses bairros escolheram, por meio do Orçamento Participativo (OP), em 2011, que obras fossem executadas nesses locais. No entanto, as promessas nunca saíram do papel.

Esses dois casos fazem parte do total de 424 obras paradas do OP que a gestão do prefeito Alexandre Kalil (PHS) recebeu ao assumir, em 2017, o comando da cidade. As mais antigas datam ainda de 2001. Segundo a SubSecretaria de Gestão Compartilhada, desde então, 18 empreendimentos (4,24%) foram retomados e concluídos. Outras 19 obras estão sendo executadas, 46 se encontram em fase de elaboração de projetos, 123 estão com pendências judiciais e 218 empreendimentos do OP encontram-se em diversos estágios, como fase inicial de estudos.

Na última semana, a reportagem visitou duas obras paralisadas que, segundo a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), devem ser executadas ainda neste ano. Morando há 30 anos no bairro Tupi B, dona Geralda conta que, em 2011, toda a comunidade se mobilizou para votar no OP Digital. A promessa era que cerca de 500 m que compõem a avenida Basílio da Gama receberiam passeio; a via seria alongada; o esgoto canalizado; e uma praça, feita. Mas nada aconteceu.

“Tem barata demais, mosquito demais, pernilongo demais. É uma sujeira, não podemos deixar as crianças irem para a rua. Elas têm que ficar presas”, conta ela, que mora com os três netos. “A gente vê as outras ruas limpinhas, asfaltadas, e nós estamos abandonados no meio dos ratos”, completa.

Já no bairro Aparecida 7ª Seção, próximo à rua Cirilo Gaspar de Araújo, o odor do esgoto a céu aberto é perceptível de longe. Cavalos, mosquitos e muito lixo compõem o cenário de uma obra esquecida. Moradores contam que a promessa era canalizar o esgoto e construir uma avenida duplicada, que ligaria as avenidas Américo Vespúcio e Carlos Luz. O técnico em prótese dentária Cláudio Moraes, 52, diz que antes da votação do OP, em 2011, o empreendimento já era alvo de promessas.

“A rua parece que ia chamar ‘da Paz’, mas não tem nada disso. Você pega um prato de comida e é um calor desse, sobe aquele mau cheiro. Isso aqui tá pior que a lagoa da Pampulha, está fedendo. Se essa obra sair eu vou levantar uma taça de chope e falar: ‘até que fim’ e vou me embebeda’”, brinca.

Questionada sobre o valor total dos empreendimentos, a assessoria de imprensa do Executivo não respondeu, mas informou que o recurso de R$ 60 milhões para as obras, anunciado no ano passado pelo prefeito, não foi efetivado porque é preciso aguardar tramitação do projeto na Câmara Municipal.

Ainda segundo a PBH, todas as possibilidades de investimentos estão sendo consideradas, como o Fundo Municipal de Saneamento e programas e recursos do governo federal e de outros agentes financeiros. Sobre a quantidade de obras que pretende concluir até 2020, o Executivo informou apenas que estão “empenhados em concluir o maior número de empreendimentos possível”. 

FOTO: Leo Fontes
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Sem esperança

“O sentimento que eu tenho? Vou ser sincero: eu não tenho nem sentimento. Acho que isso não vai sair nunca. Tem 40 anos que eu moro aqui, e nada. Criei dois filhos, já cresceram, já casaram, cada um já cuidou da sua família, e o brejo tá aí, na mesma.”

José de Freitas (Zé Calango)

75 anos, morador do bairro Tupi B

FOTO: Leo Fontes
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Poucas mudanças

“Essa avenida ia ser boa não só para nós, mas para a região inteira. Nesse tempo todo que eu moro aqui, a única mudança que teve foi a construção da avenida Américo Vespúcio, mais nada. O córrego era limpinho. Hoje, aqui, os ratos batem nos gatos.”

Valter Eustáquio

64 anos, morador do bairro Aparecida 7ª Seção

 

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