Cultural

‘Pequenos’ deslizes contradizem revolta por desmandos 

Para muita gente, irregularidades menores não fazem mal

Por Tâmara Teixeira
Publicado em 27 de julho de 2015 | 03:00
 
 
 
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No último aniversário na família, Marcos* bradava ferozmente contra a governo federal, a quem culpava pela crise que atinge em cheio o seu posto de gasolina e lhe causa grande prejuízo. “A gente é quem paga o pato por causa dessa roubalheira”. Os convidados que assistiam à cena e balançavam afirmativamente a cabeça só não imaginavam que o desabafo era de autoria do mesmo empresário que fornece notas frias para vereadores da capital mineira.

Na roda de amigos, na família ou no trabalho, os discursos marcados pela incoerência ética se multiplicam sem o controle de nenhuma corregedoria. Eles, muitas vezes, passam ao largo da fiscalização da polícia e ficam submetidos apenas à consciência de cada um.

As contradições do dia a dia explicitam uma cultura brasileira que, diante de uma sistema punitivo lento, não raramente é complacente com a corrupção, e vê com certa naturalidade os pequenos delitos.

Os amigos Cláudio* e Carlos* também se queixavam dos escândalos de corrupção no país. Na mesa de um tradicional restaurante belo-horizontino, as reclamações foram ouvidas minutos antes de a dupla pedir dois favores ao garçom: que a nota para reembolso da empresa fosse acima do valor consumido e que ocultasse bebidas alcoólicas.

Contradição. A distância entre quem negocia um lugar melhor na fila de um hospital para um parente e quem paga propinas milionárias pode ser apenas uma questão de oportunidade, diz Gil Castello Branco, diretor do site Contas Abertas, que acompanha a execução orçamentária da União. Para ele, o comportamento irregular se torna costume. “Quando essa pessoa ocupa um cargo, age da mesma maneira. O tamanho da corrupção varia com a oportunidade”.

Já Roberta Holder, analista de redes sociais da Controladoria Geral da União (CGU) observa que “as pessoas não percebem que cometem ilegalidades quando forjam a carteira de estudante”.

Responsável pela transparência e pelo combate à corrupção, o órgão criou a campanha “Pequenas Corrupções: Diga Não”. Com a hastag #NãoTemDesculpa, levantamento da CGU revelou repostas mais comuns para tentar justificar os crimes: “é bem rapidinho”, “o exemplo tem que vir de cima” e “tem coisa muito pior”.

*Nomes fictícios

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