Assim como grande parte dos parlamentares de esquerda, construí minha vida política nos movimentos sociais, principalmente, no estudantil. Nele, participei de muitas campanhas, que ajudaram a forjar os valores que moldam a minha atuação parlamentar. Nos debates recentes sobre dívida pública de Minas Gerais, recordei duas delas: as atividades da Auditoria Cidadã da Dívida e a defesa das estatais como garantidoras das nossas riquezas e patrimônio do povo. As duas questões tornaram-se princípios pelos quais defino minhas ações nos debates atuais.
É impossível falar de uma dívida na ordem de R$ 160 bilhões sem questionar sua composição, sabendo que o pagamento dela vai trazer prejuízos e sofrimentos para a população mineira. Graças a uma decisão do Supremo Tribunal Federal, o pagamento das parcelas da dívida de Minas Gerais está suspenso até o próximo 20 de dezembro. Já foi feito um pedido para prorrogar este prazo até abril de 2024.
A vigência da decisão judicial vigora desde 2018 e desde lá não foram contraídos novos empréstimos. Mesmo assim, o passivo saltou de R$ 114 bilhões para R$ 160 bilhões. Isso acontece porque os encargos continuam a incidir mensalmente, levando a um crescimento exponencial da dívida com suas taxas de juros abusivas.
Em todas as renegociações da dívida, repetiram-se os juros altos e a indexação por índices aviltantes, sempre em prejuízo para o Estado. O que estamos propondo agora é fazer uma espécie de auditoria dessa dívida. Fazer um balanço, onde ficará claro que essa dívida foi paga várias vezes. Entre 1998 e 2019, Minas Gerais pagou R$ 45,8 bilhões de juros e amortizações. Contraditoriamente, o passivo passou de R$ 14,9 bilhões para R$ 93,7 bilhões.
A cobrança de juros baseada no IPCA mais 4% é um escândalo, levando em conta que o crescimento da economia foi de 1,2% nas últimas quatro décadas. No meu Projeto de Lei Complementar 245/2023, defendo que seja feito um recálculo a partir de uma taxa baseada na soma do IPCA e a média do crescimento real do Produto Interno Bruno (PIB) dos últimos cinco anos. Sem redução nas taxas de juros e sem redutor no estoque da dívida, qualquer negociação não será justa, aceitável e, muito menos, pagável.
Origem. Se foram os juros abusivos que levaram nossa dívida à casa das centenas de bilhões, a origem dela é tão absurda quanto injusta. Foi a União, que se coloca agora como credora, que impôs ao Estado a necessidade do endividamento.
A mudança tributária praticada no governo Fernando Henrique Cardoso quebrou os Estados e municípios exportadores de commodities. No seu primeiro governo, o tucano praticou o câmbio fixo, com a equiparação do real com dólar, fazendo o Brasil virar o paraíso das importações e o inferno para as exportações.
Assim que foi reeleito, FHC adotou o câmbio flutuante e precisava impulsionar as vendas para o exterior. O caminho foi aprovar a Lei Kandir, que tirou o imposto da origem, sem colocar no destino, como fizemos agora na reforma tributária. Desonerou o ICMS nas exportações, tirando as receitas próprias dos subnacionais.
A maldita lei tirou da receita de Minas, no intervalo de 1996 a 2019, mais de R$ 135 bilhões. A compensação desse montante por parte da União foi um desrespeito ao pacto federativo. Corresponde a pouco mais de R$ 8,7 bilhões, pagos em 17 anos (R$ 6,5 bilhões do Estado e R$ 2,1 bilhões dos Municípios), quantia que não chega a 7% do valor devido.
Em contraponto, a União ficou com os bônus da Lei, através das reservas cambiais criadas em prejuízo dos estados primários exportadores. Qualquer proposta de renegociação tem que passar por uma revisão histórica deste crime federativo. E fazer justiça, mesmo que tardia, buscando uma recomposição pelas perdas, proporcionais ao impacto em suas receitas, como também propõe o PLC que apresentei.
Quando apresentei minhas opiniões sobre a dívida de Minas, materializadas no PLC 245, elas foram recebidas por alguns com descrença. Com o tempo, já vejo uma mudança no ambiente, principalmente no que diz respeito à federalização das estatais mineiras, que já manifestei minha rejeição.
Recebo cada vez mais apoio na defesa que faço para que nossas empresas continuem sendo patrimônio do povo mineiro. Como contei no início do texto, quando mantemos nossos princípios, somos fiéis aos nossos compromissos e nos tornamos dignos da representação parlamentar.
REGINALDO LOPES
Deputado federal (PT-MG)
dep.reginaldolopes@camara.gov.br