O TEMPO

Os riscos do acordo entre o Mercosul e a União Europeia

Ainda bem que o tratado depende de aprovação do Congresso. Leia a coluna de Reginaldo Lopes


Publicado em 09 de julho de 2019 | 03:00
 
 
 
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Anunciado durante o encontro do G20 no Japão, o acordo comercial firmado entre o Mercosul e a União Europeia (UE) ainda tem informações incompletas. Ele vai abranger uma população de 780 milhões de pessoas, com PIB total de US$ 20 trilhões (um quarto da economia mundial). O processo começou em 1992, quando o Mercosul e a União Europeia assinaram um termo de cooperação que foi promulgado em 1995. A demora é consequência da complexidade de interesses envolvidos, tanto internos quanto nas relações comerciais entre os 32 países.

Mora aí uma primeira preocupação: a assinatura acontece justamente sob a orientação de um governo brasileiro que tem apenas seis meses e pode ser considerado o mais entreguista da nossa história. Nosso comércio exterior está na jurisdição do chanceler Ernesto Araújo, que, por conta do seu fanatismo ideológico e religioso, fez com que a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), ligada às negociações, trocasse de presidente três vezes desde o começo do ano. Ou seja, mesmo sem se conhecer profundamente o que foi assinado, já é motivo de preocupação por saber quem assinou.

Ainda bem que o acordo depende de aprovação do Congresso, o que vai exigir, mais uma vez, que o Parlamento brasileiro exerça seu poder moderador, tão necessário diante de um governo inconsequente. É importante que os parlamentares envolvam amplamente a sociedade no debate, principalmente o empresariado e os representantes dos trabalhadores, que podem ser prejudicados com o aumento do desemprego.

A intenção da União Europeia é exportar para a região do Mercosul produtos industriais, particularmente da indústria de ponta e dos serviços de tecnologia mais avançada. O tratado com a UE possibilita a abertura dos nossos mercados para compras governamentais, que no Brasil são da ordem de R$ 78 bilhões. Com isso, empresas europeias vão poder competir em licitações no país nas mesmas condições das brasileiras.

Do lado de cá do Atlântico, a situação não mudou muito desde que as primeiras caravelas ancoraram em nossas praias. As exportações brasileiras são predominantemente de produtos primários. Minas Gerais, que é o segundo maior Estado exportador para a Europa, vendeu US$ 5,5 bilhões para aquele continente no ano passado. Quase a totalidade foi na exportação de minérios e de proteínas animal e vegetal. Esses foram justamente os produtos desonerados pela Lei Kandir, criada em 1996, e depois constitucionalizada para dar imunidade tributária do pagamento do ICMS às exportações de produtos primários ou semielaborados.

A Lei Kandir é uma das responsáveis pelo processo de desindustrialização que o Brasil está vivendo, fazendo com que o segmento que já representou mais de 30% do PIB corresponda hoje apenas a 11%. Na análise do acordo com a União Europeia, o Congresso vai ter que debater a implementação de uma reforma tributária que retome a taxação das exportações, ou estaremos decretando de vez o fim da indústria nacional.

Finalmente, antes de o acordo entrar em vigor, o Congresso tem que criar mecanismos de proteção para setores que estão em desenvolvimento. Em Minas, temos a produção de queijos e de vinhos e a já tradicional indústria eletrônica do Sul de Minas. Alguns deles podem ser dizimados pela entrada dos produtos europeus. Se esses setores não forem protegidos e incentivados, o acordo vai representar mais um duro golpe contra nossa já combalida economia.

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