Já tratamos aqui, neste espaço, dos impactos que a inteligência artificial causa nos níveis de empregabilidade, em que a automação de processos fez com que os robôs passassem a ocupar cada vez mais o lugar do homem na indústria e em outros ramos do trabalho.
Na semana passada, um seminário realizado no Vaticano analisou outro aspecto do fenômeno, abordando a ética em tempos de algoritmos. Mais de 450 participantes do evento – incluindo cientistas da computação e filósofos, teólogos e dirigentes de empresas – concordaram em compartilhar a recomendação de que “a humanidade utiliza a tecnologia, e não vice-versa, para que não se torne uma ditadura do algoritmo”.
A decisão do Vaticano de abordar a inteligência artificial partiu do próprio papa Francisco. Em carta enviada ao seminário, para contornar uma indisposição que o impediu de participar, ele afirmou que, “dos canais digitais disseminados na internet, os algoritmos extraem dados que permitem controlar hábitos mentais e relacionais, para fins comerciais ou políticos, geralmente sem o nosso conhecimento.
Essa assimetria, na qual poucos sabem tudo sobre nós, enquanto nós nada sabemos sobre eles, entorpece o pensamento crítico e o exercício consciente da liberdade”.
O trabalho apresentado no Vaticano foi orientado pela Academia Pontifícia para a Vida, órgão responsável na Igreja Católica por tratar dos códigos morais e teológicos, que coordenou um grupo de estudos e elaborou uma carta de princípios aprovada no final do encontro.
Ela reconhece a importância das máquinas inteligentes, mas alerta para uma preocupação de que ferramentas sejam usadas para sobrepor alguns grupos sociais em detrimento de outros.
A carta ganhou o nome de “Chamado de Roma por Ética na Inteligência Artificial” e enumera seis princípios que devem ser seguidos pelos signatários, incluindo os dirigentes de grandes empresas de tecnologia, como IBM e Microsoft, que participaram do encontro e concordaram com os seus termos.
O princípio da “transparência” defende que os sistemas de inteligência artificial devem ser claros ao expor a motivação das regras que vão conduzir o serviço. Na “responsabilidade”, os desenvolvedores de máquinas inteligentes devem trabalhar com compromisso ético e zelo pelo ser humano. A “inclusão” professa que a adoção de estratégias de inteligência artificial deve levar em consideração as necessidades de todos os seres humanos. No que diz respeito à “confiabilidade”, os sistemas de IA devem trabalhar gerando confiança nos usuários. Já quanto à “imparcialidade”, os criadores das máquinas devem atuar imparcialmente, sem qualquer viés, para resguardar a justiça e a dignidade. Por fim, em termos de “segurança e privacidade”, os sistemas devem ser criados tendo a segurança em mente, sem deixar de respeitar a privacidade dos usuários.
Ao entrar nesse tema, o papa Francisco demonstra mais uma vez que está muito antenado com os dilemas do seu tempo. Ele mesmo afirma que, ao definir esses princípios, não está se colocando contra a tecnologia, que considera também um dom de Deus, mas aponta para a necessidade de se criar uma espécie de “algor-ética”, para que a robotização não esteja apenas a serviço de más intenções políticas e comerciais, e sim a favor do desenvolvimento da humanidade.