No anúncio do PSB de que indica Geraldo Alckmin para ser vice em uma chapa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o petista voltou a afirmar que os dois, mesmo adversários no passado, sempre tiveram uma relação harmônica. Segundo ele, o nível de agressividade que se vê nas disputas políticas hoje não se aplicava àquela época. No entanto, por diversas vezes, os dois agora aliados trocaram farpas pesadas e reclamaram do comportamento um do outro.
Parado na economia e acelerado nos escândalos
A tensão na disputa de 2006, quando Lula tentava a reeleição e tinha Alckmin como adversário nas urnas ficou flagrante em um debate entre os dois em 24 de outubro de 2006, na TV Record. Aquele foi um dos encontros mais quentes da campanha, com muitas trocas de acusações e com participações até das plateias.
Naquela ocasião, Alckmin já iniciou as críticas a Lula nas considerações iniciais, dizendo que o governo Lula tinha duas marcas: “Parado na economia e acelerado nos escândalos". Já na primeira pergunta ele questionou o fato de cinco ministros de Lula terem sido denunciados, questionando se era coincidência, ao que Lula respondeu: "Ministério Público no meu governo não engaveta nenhuma denúncia”. Isso gerou uma série de atritos, com Alckmin dizendo que Lula falava mentia e um clima pesado que durou todo aquele debate.
Sanfona quebrada
No dia seguinte, o petista reclamou do nível do debate e afirmou que o então tucano não tinha o mesmo nível de outros poíticos com quem já tinha debatido no passado, como Ulysses Guimarães, José Serra, Mario Covas, Paulo Maluf e Fernando Collor de Mello.
“Não pensei que estava na frente de um candidato. Pensei que estava na frente de um delegado de porta de cadeia”, afirmou Lula.
Alckmin, por sua vez, reagiu dizendo que a declaração era “desespero” do petista. “O tom não foi agressivo. Estou absolutamente zen. Inclusive dormi tranqüilo, estou com a consciência tranqüila. O Lula não pode achar que é normal essa mentirada toda que ele fala pelas costas. Eu falo a verdade e frente-a-frente”, disse.
Lula, por sua vez, acusou Alckmin de ser arrogante e o chamou de “sanfona quebrada”. “O projeto deles é o de pessoas que falam de nariz em pé e com arrogância. Para política, isso é muito pobre. Alckmin é uma sanfona quebrada, que faz o mesmo som de arrogância na campanha inteira. O que se viu foi um pouco da elite política brasileira, ela foi implacável com Juscelino (Kubitschek), com Getúlio (Vargas), com Jango”, afirmou sobre Alckmin.
Chefe de quadrilha
Embora esse debate tenha marcado o ápice da relação difícil entre os dois, em junho daquele ano já havia trocas duras de farpas públicas. No dia 17 daquele mês, Geraldo Alckmin questionou “quem era o "chefe da quadrilha de 40 ladrões" no governo. "Sobre caráter, eu acho difícil que o presidente Lula possa discorrer sobre esse tema", criticou, em um evento em Americana.
Durante a campanha, em setembro, Lula chegou a ganhar um direito de resposta contra Alckmin no rádio após o adversário compará-lo a um "ladrão de carros". “O que nós estamos vendo no governo federal é uma sofisticada organização criminosa”, disse Alckmin na peça que gerou direito de resposta.
Ainda naquele mês, Lula também criticou o então adversário, sugerindo que a administração de Alckmin no governo de São Paulo não agiu de forma efetia quando ocorreram diversos atentados de uma facção criminosa em São Paulo:
"Estamos agindo sem varrer o lixo para debaixo do tapete. Sem medo de punir. Seja quem for. Doa a quem doer. Um comportamento bem diferente de certos políticos que hoje se dizem defensores da ordem e da moral e que ontem faziam o contrário. O Brasil sabe muito bem quem deixou São Paulo refém do crime organizado. E os paulistas sabem quem mandou engavetar mais de 60 CPIs para que seu governo não fosse investigado", disparou.
Picolé de chuchu
Embora tenham ganhado mais evidência em 2006, quando disputaram o Planalto, as desavenças entre Lula e Alckmin continuaram no decorrer dos anos. Em 2014, por exemplo, Lula deu corda à zombaria de que Alckmin seria um “picolé de chuchu”.
“Não é à toa que esse governador tem apelido de picolé de chuchu. É insosso, como se fosse comida sem sal. Nunca fala de nenhum problema do Estado, nunca responde por nada”, disse Lula durante comício de Alexandre Padilha, que disputava o governo do Estado naquele ano.
Dois anos depois, Alckmin disse que “Lula é o retrato do PT, partido envolvido em corrupção”. As declarações foram feitas durante um evento de entrega de veículos para a PM.
“O Lula é o Partido dos Trabalhadores. O Lula é o retrato do PT, partido envolvido em corrupção, sem compromisso com as questões de natureza ética, sem limites”, afirmou.
Desvio de merenda
Naquele mesmo dia, o petista reagiu por meio de nota: “Seria mais proveitoso para a população de São Paulo se a imprensa perguntasse e o governador explicasse os desvios nas obras do metrô e na merenda escolar, a violência contra os estudantes e os números maquiados de homicídios no estado, ao invés de tentar desviar a atenção para um apartamento que não é e nunca foi de Lula”, disse.
Em março de 2016, quando Lula era investigado pela Lava Jato, Alckmin disse que o petista usava subterfúgios para fugir da Justiça. "O presidente Lula se vangloriava de que, pela primeira vez na história do Brasil, a polícia tem independência para poder investigar. Então não pode agora usar de subterfúgios para fugir da Justiça. Isso é inadmissível", disse, após participar de um evento com a então presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto.
Volta à cena do crime
As rusgas continuaram em 2017. Em dezembro daquele ano, Alckmin disse que Lula queria “voltar à cena do crime. “Depois de ter quebrado o Brasil, Lula diz que quer voltar ao poder, ou seja, ele quer voltar à cena do crime. Nós o derrotaremos nas urnas. Lula será condenado nas urnas pela maior recessão da história”, disse, nos preparativos para sua nova campanha à presidência no ano seguinte. Lula acabou não disputando. Estava preso em Curitiba e sua candidatura não foi autorizada pela Justiça Eleitoral
No ano da campanha, os atritos já se davam em janeiro. Na ocasião, Alckmin dizia que Lula seria condenado pelos brasileiros nas eleições de outubro daquele ano, que acabaram elegendo Jair Bolsonaro. “Lula será condenado nas urnas pela maior recessão da nossa história, pelos 15 milhões de empregos perdidos, pelas milhares de empresas fechadas, pelos sonhos desfeitos e negócios falidos”, disse Alckmin.
Em agosto daquele mesmo ano, o petista, em artigo publicado no site de seu instituto, comparou o então tucano a Michel Temer e disparou contra ele as gestões tucanas no Brasil. “Geraldo Alckmin (PSDB) e Michel Temer (MDB) são duas faces de uma mesma moeda: a agenda neoliberal que já afundou o país nas gestões do ex-presidente FHC, e que agora colocou o país em uma das maiores crises da sua história, sob a batuta do governo ilegítimo de Michel Temer. Isso é facilmente demonstrável através da posição de seus respectivos partidos nas votações no Congresso Nacional favoráveis a medidas tão nefastas, como a emenda constitucional do teto dos investimentos públicos e a reforma trabalhista”.
Agora, os ex-adversários estão na mesma chapa e Alckmin foi convidado para, inclusive, construir o plano de governo do petista para ser apresentado nas eleições de outubro de 2022.
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