O assunto da semana, na política e nos mercados, deve ser mesmo a interferência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao trocar o presidente da Petrobras em meio à insatisfação demonstrada por ele com o ritmo da elevação do preço dos combustíveis. A preocupação com o alta dos valores pagos pelo diesel e pela gasolina é até legítima e o status da companhia permite a mudança, mas há graves consequências, evidentemente.
Em primeiro lugar, que fique claro que Bolsonaro não fez nada que seus antecessores também não tenham feito. Fernando Henrique, Lula, Dilma e Temer, em maior ou menor grau, interferiram na companhia e trocaram presidentes em seus mandatos. Em vários casos, pelo mesmo motivo: a insatisfação com a alta dos preços. Bolsonaro, portanto, não faz nada ilegal nem inusual.
Além disso, é perfeitamente legítima a preocupação e a desconfiança com os preços praticados. O Brasil enfrenta uma crise sem precedentes, o governo tem o controle da companhia e vê uma empresa que detém praticamente um monopólio do setor elevando preços fortemente por decisão de seu conselho que tem o objetivo de fazê-la lucrar, enquanto o chefe do Executivo perde popularidade. Com os preços em alta, há risco de inviabilizar certas atividades econômicas, como mostrou O TEMPO na edição de hoje. A solução da intervenção, vista por essa ótica, parecia até óbvia, considerando que o governo não quer e nem pode (por falta de dinheiro) botar a mão no bolso para subsidiar os combustíveis no Brasil.
Mas a solução de interferência não é, evidentemente, milagrosa. O alto preço da gasolina não é exatamente fruto de ganância da Petrobras ou só da mera vinculação ao mercado internacional, mas, principalmente, de um dólar em alta, gerado pela falta de confiança no país. Intervir na Petrobras não resolve esse problema. Muito pelo contrário, como podemos ver nos mercados nesta manhã. Quando escrevo esse texto o dólar sobe fortemente, pressionando ainda mais o preço dos combustíveis, e as ações da Petrobras e de outras estatais despencam. Os valores da petroleira e das próximas vítimas - Banco do Brasil e Eletrobras – derretem.
Além do mais, colocar um general no comando da estatal para controlar preços torna muito difícil que a Petrobras cumpra seus planos de se desfazer de refinarias e vender ativos, o que é fundamental não apenas para que ela reduza seu endividamento mas também para que a concorrência seja saudável. A Petrobras domina o mercado, mas legalmente não tem mais o monopólio da produção e da venda de combustíveis no Brasil há muitos anos. Se não há investimento de outras companhias no setor é pelo simples fato de que elas acham que não vale a pena encarar uma Petrobras que está nas mãos do governo e que, quando houver pressão, reduzirá o preço dos combustíveis por interferência do Planalto, quebrando a concorrência. E a permanência de um virtual monopólio de fato tende, no longo prazo, a deixar os preços mais altos. Principalmente quando a Petrobras precisar compensar os enormes prejuízos que deve ter com a intervenção.
Ainda que, mesmo diante dos pontos de vista diferentes, alguns acreditem que a intervenção é sim o melhor caminho, há outro problema: isso não foi combinado com o eleitor. Bolsonaro ganhou a eleição prometendo uma política liberal. Apresentou Paulo Guedes como fiador de uma proposta que incluía privatizações das estatais. Não fez nenhuma e ainda criou uma estatal. Interferiu na Petrobras e ameaça fazer o mesmo com o Banco do Brasil. Há um claro descompasso da prática com a promessa, ainda que quem conheça Bolsonaro minimamente saiba que ele nunca foi liberal.