Política em Análise

Bolsonaro em busca de proteção

Ao mexer na Esplanada, presidente tenta acalmar o Centrão e controlar definitivamente as Forças Armadas, mas pode não conseguir nem uma coisa nem outra

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 30 de março de 2021 | 12:01
 
 
 
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Acuado por uma crise sem precedentes que inclui uma pandemia descontrolada, a incapacidade de manter uma boa relação com os demais Poderes e uma popularidade em queda, o presidente Jair Bolsonaro resolveu mexer. Não fazendo uma reforma ministerial tradicional, com discussões demoradas e acolhimento de novos aliados em espaços de governo, mas tirando juntos aqueles que já viraram problemas incontornáveis e os que não toparam ir até as últimas consequências em sua batalha sem fim. Ontem, ao trocar os comandos de seis ministérios, Bolsonaro, acima de tudo, buscou proteção. De duas formas: ao afagar o Centrão com um cargo na articulação, e ao tentar tomar de vez o controle político das Forças Armadas – o que ele também enxerga como proteção, pois a ameaça de usar militares contra as instituições é método do governo. Corre o risco de não conseguir nem uma coisa nem outra.

O caso mais sensível é o do Ministério da Defesa. Os relatos vindos de Brasília vão na linha de que Fernando Azevedo e Silva não topou esticar ainda mais a corda para politizar as Forças Armadas. O limite dessa pressão ainda não está claro. Há quem fale que havia o pedido de apoio a um Estado de sítio e há quem cite que o problema central era a resistência em tirar do cargo Edson Leal Pujol, chefe do Exército, e uma das vozes hoje a condenar a politização da instituição. Sendo um ou outro o problema, o certo é que a reação nos núcleos militares foi ruim. Tirando um grupo da reserva que está sempre sedento de ter o poder que um dia já teve, nas Forças Armadas o principal foco dos comandantes é garantir tranquilidade e segurança aos quartéis e ao país.

Assim, diante da clara interferência em prol da politização das instituições de defesa brasileiras, os comandantes das Três Forças estão se reunindo desde ontem para discutir uma renúncia conjunta. A saída é provável. A de Pujol, praticamente certa. Ainda que a debandada total não ocorra, os comandantes querem dar o mesmo recado dado na carta de Fernando Azevedo e Silva: tudo tem limite e o Exército não quer embarcar em novas etapas da aventura proposta por Jair Bolsonaro. Assim, se o presidente queria ter o controle mais efetivo das Forças Armadas, pode colher o contrário.

No que diz respeito à troca na articulação política, a entrada de Flávia Arruda na Secretaria de Governo tem o objetivo de estender a mão ao Centrão, que anda irritado com os rumos do governo. Parece pouco. A pasta de articulação sem qualquer dúvida ficará esvaziada com a deputada não tendo moeda para barganhar – afinal a capacidade de negociação de emendas em um Orçamento bagunçado está esgotada – e não tendo força suficiente no governo para garantir os acordos. Isso só seria possível se houvesse no cargo um ministro com relativa ascendência sobre Bolsonaro, que tivesse uma carta branca. Nenhum terá. Flavia, uma deputada de primeiro mandato e de fora do núcleo bolsonarista, muito menos. A menos que o verdadeiro ministro seja um integrante do Centrão que não foi nomeado.

Agrada evidentemente mais o Congresso a mudança no Ministério das Relações Exteriores onde, como é opinião unânime fora do grupo ideológico do governo, pior não tinha como ficar. Mas essa troca também deu uma desanimada na militância, que foi mobilizada nos últimos dias para defender Ernesto Araújo e sentiu-se decepcionada com mais uma derrota. Assim, se não conseguir a paz com o Centrão e não capturar as Forças Armadas, arranhando sua relação com o núcleo duro do bolsonarismo, o presidente pode acabar terminando a semana com uma crise maior do que a que tinha quando começou essa.

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