Política em Análise

CPI da Petrobras mostra desespero

Se vingasse, iniciativa seria um tiro no pé do próprio governo às vésperas da disputa eleitoral

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 20 de junho de 2022 | 11:01
 
 
 
normal

A reação barulhenta do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seus aliados, em especial do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), ao reajuste dos combustíveis dá o tom do tamanho do problema eleitoral que ele causa para o atual chefe do Executivo. A ponto de Bolsonaro, entre outras coisas, propor uma CPI da Petrobras, que teria como principal alvo alguns dos nomes que ele próprio indicou ao conselho de administração da companhia. Uma medida desesperada que tenta passar para a opinião pública que ele está fazendo alguma coisa e desvencilhar-se o máximo possível da culpa pelo aumento nas bombas. Com um enorme risco de se transformar num tiro no pé caso saia do discurso. Hoje, parece difícil e tendência é nunca ser instalada.

Um dos pontos enfatizados por Lira e Ciro Nogueira se dá a respeito da necessidade de rediscutir no Congresso a política de preços da companhia. Acontece que a estratégia é perigosa por um ponto em especial: se a essa altura o governo fizer ações para alterar o regime de preços, vai derrubar todo seu discurso feito até aqui, de que não era possível mexer nos valores cobrados pela companhia e que os Poderes da República eram meros passageiros desse escalada que se vê no país de longa data. De 2021 para cá, a Petrobras fez 15 reajustes. Do início do governo Bolsonaro até agora, a gasolina subiu mais de 70%. E aí agora vai-se descobrir que era possível mudar essa política de preços?

Além disso, Bolsonaro fala em CPI, o que pode ser perigoso para o próprio governo. Como a maioria dos membros do conselho, que entregaram à direção da companhia a decisão de aumentar os preços, foram indicados pelo Executivo, o risco de que uma investigação acabe por fustigar o próprio Palácio do Planalto e seus ministérios é real. Como investigar o assunto sem colocar no debate o ex-presidente da companhia, o militar Joaquim Silva e Luna, por exemplo. O governo vai arriscar colocá-lo no fogo cruzado? É aquela velha história: CPI sabe-se como começa mas não sabe-se como termina. 

Mais do que isso, o simples fato de a CPI funcionar durante a campanha já colocará o assunto da alta dos combustíveis como o debate principal durante a corrida ao Palácio do Planalto. Diariamente se falará de preços de combustíveis, comparando a situação de agora com a de antes da Lei das Estatais e da política de paridade de preços internacionais. Isso em algum aspecto gera vantagem para o governo? Ninguém que não esteja completamente desesperado pode achar algo assim. O que explica por qual motivo, apesar dos apelos do presidente, o assunto ainda não ganhou tanta repercussão junto a sua base.

Por isso, o mais provável é que essa proposta nunca saia do papel e que tenha servido mesmo para antecipar a saída do presidente da companhia, José Mauro Coelho, indicado pelo presidente e que já teve um substituto também escolhido: Caio Paes de Andrade. Coelho renunciou nesta segunda-feira (20) em meio às pressões. Com isso, pressão por CPI tornou-se ainda menor.

Mas a mera discussão da hipótese de uma CPI já derrubou ações na semana passada e o presidente vangloria-se do fato de que, uma vez aberta uma comissão, a companhia perderia mais R$ 30 bilhões. Dinheiro de recurso, em grande parte, externo. Estamos falando de fuga de capitais e a consequência disso é real mais fraco, dólar mais forte, preços mais altos e pressão por reajustes ainda maior. A solução dada pelo presidente, portanto, tende a piorar a situação às vésperas da eleição. Isso sem falar do fato de que a redução de valor vem no momento em que o governo revela estudos para vender a empresa, depois de fazer o mesmo com a Eletrobras. É jogar dinheiro fora.

Outra alternativa colocada por Lira é o aumento da taxação de lucros da Petrobras. Mas não existe regra que valha para uma só empresa. Teria que valer para todo o setor e ninguém tem dúvida de que isso seria repassado aos preços. E usar essa taxação para furar o teto também é driblar regras fiscais, prejudicando a credibilidade da economia e com consequente aumento no dólar.

Fora isso, o governo usou as armas que tinha no Congresso. Forçou uma redução do ICMS, reduzindo arrecadação dos Estados em troca de uma redução dos preços, praticamente toda engolida por esse reajuste. Outra alternativa que teria, mas que se recusa a adotar, é a da criação de um fundo de estabilização dos preços. Esse fundo seria utilizado toda vez que os patamares internacionais do petróleo se elevassem. O grande problema é que esse mecanismo seria alimentado com recursos provenientes de períodos com preço mais alto e haveria uma demora para que ele tivesse corpo para conseguir atuar. E o governo tem pressa para resolver a situação ou minimizá-la até outubro. A tarefa é difícil.

O governo ainda teme enfrentar um outro problema, que não é fácil de resolver no curto prazo, após deixar a situação chegar no limite. Um eventual interferência direta nos preços, que o governo poderia fazer se quisesse em nome da função social da companhia e do fato de que ela detém tão grande participação no mercado que é inconcebível que seus preços não sejam administrados, geraria o risco de desabastecimento no mercado do diesel importado. Por isso a solução até agora tem sido a de reclamar o máximo da Petrobras, para minimizar o desgaste com a alta, sem utilizar a maioria dos votos no conselho para segurar os reajustes.

Opositores fazem a festa com essa postura pouco convincente e dão graças a Deus de não estarem no lugar do presidente em um momento em que qualquer solução tem um custo altíssimo. Bolsonaro apanha todo dia e, quando bate, é em seu próprio governo. O que a oposição poderia querer de melhor?

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!