Política em Análise

Duas guerras de Bolsonaro

Presidente resolveu lutar com a opinião pública e a diplomacia mundial e com os instrumentos de controle e investigação

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 24 de agosto de 2019 | 03:00
 
 
 
normal

O presidente Jair Bolsonaro resolveu lutar em duas guerras ao mesmo tempo. Uma, com a opinião pública e a diplomacia mundial. A outra, com os instrumentos de controle e investigação, como o Coaf, a Receita Federal e a Polícia Federal. Só uma dessas batalhas já tinha potencial para causar uma crise sem precedentes no governo. As duas juntas podem implodir a gestão que está há apenas oito meses no poder.

Na batalha para desqualificar a denúncia sobre o aumento do desmatamento e das queimadas na Amazônia, o governo já perdeu. Todo o mundo civilizado se levantou contra o problema, incluindo países governados pela direita, como a Grã-Bretanha, de Boris Johnson, e os Estados Unidos, de Donald Trump.

O assunto vai ser discutido em reunião do G7, e sanções contra o Brasil devem ser aplicadas. Há grande chance de que a Europa suspenda a importação de carne brasileira. O acordo entre o bloco daquele continente e o Mercosul é natimorto. O desastre para a imagem internacional do Brasil é tremendo. O país tornou-se um problema para o mundo.

Na segunda batalha, o futuro também não parece auspicioso para Jair Bolsonaro. Quem tentou controlar a Polícia Federal até hoje teve problemas. As ameaças do chefe da nação contra o diretor geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, e o desdém com que trata o ministro Sergio Moro vão custar caro.

Hoje, o ex-juiz prefere ficar no governo. Sua avaliação é a de que, antes de o Supremo Tribunal Federal (STF) avaliar sua suspeição no caso envolvendo o ex-presidente Lula, não vale a pena deixar a gestão federal. Mas parece cada dia mais próximo o dia em que ele vai optar pela saída.

Bolsonaro escolheu um ministro que não pode demitir. Moro é maior que ele na opinião pública. Se dispensar aquele que foi o símbolo do combate à corrupção, o governo perde metade ou mais de sua força junto à população. Por isso, Bolsonaro fala mal de Moro pelos cantos, desautoriza-o, tira seu poder, descumprindo o que lhe prometeu na campanha, mas não manda o ministro embora, como fez com Gustavo Bebianno e o general Santos Cruz.

A ideia de nomear o ex-juiz para o STF também já foi abortada, em nome de alguém “terrivelmente evangélico”, o que Moro não é, ao contrário, por exemplo, do advogado geral da União, André Mendonça, ou do juiz federal fluminense Marcelo Bretas.

Há um enorme risco para o presidente nessa estratégia de cozinhar Moro em banho-maria. A grande popularidade do ministro permite, por exemplo, que, perdendo a paciência, ele peça demissão e saia por cima. Imagine que Moro deixe o governo destacando que tentou dar independência aos órgãos para combater a corrupção, que acreditou no discurso de campanha do presidente de que acabaria com a mamata e a roubalheira e, uma vez no cargo, descobriu não ser bem assim?

Postura dessas teria poder suficiente para esvaziar completamente o atual governo e ainda alçar o ministro a nome forte como adversário do presidente em 2022. Bolsonaro vai mesmo pagar para ver ou vai recuar? 

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!