Política em Análise

Enterrando o voto impresso

Decisão de Arthur Lira de levar tema ao plenário é acertada e tende a reduzir argumentos em defesa de mudança nas urnas eletrônicas

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 09 de agosto de 2021 | 09:52
 
 
 
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A Câmara dos Deputados deve votar nesta semana, em plenário, a proposta que estabelece o voto com impressão no Brasil. E derrubará o assunto, como já fez a comissão especial da Casa na última semana. Quem acha que a decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), ajuda o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), ao dar sobrevida à proposta, engana-se. No máximo haverá uma transferência da pressão para o Senado. Mas com força bem menor.

Uma coisa é um tema desses ser derrotado na comissão, onde os comandos partidários alteraram membros do colegiado para garantir a goleada de 23 a 11 que vimos. Outra coisa é o plenário da Casa, composto por 513 parlamentares, referendar a tese de que não é hora para isso. A derrota do governo nesta nova votação é praticamente certa. Já seria difícil aprovar o texto com maioria simples. Necessitando de 308 dos 513 deputados, a improbabilidade é quase uma impossibilidade. Ainda mais com 15 partidos, que totalizam cerca de 330 votos, já se colocando publicamente contra a proposta. Mesmo que haja posições divergentes dentro das legendas e que sejam esperadas traições, o placar é muito amplo para ser revertido. Hoje, a base governista trabalha para tentar adiar a discussão.

Com a decisão de plenário, o presidente Jair Bolsonaro perderá seu principal argumento. O de que o Judiciário não tem que se meter no assunto, e que quem decide as regras eleitorais é o Legislativo. O que é verdade. Se os 513 deputados eleitos entendem que não é necessário implementar o voto com impressão, não há mais como isso ser discutido nesta Legislatura. Arthur Lira tem dito, como o fez hoje em entrevista à rádio CBN, que o presidente se comprometeu a aceitar o resultado sem disparar contra a Casa. O presidente não é dado a aceitar facilmente as derrotas, mas neste caso devemos lembrar que ele está nas mãos de Lira.

A tendência é que, consumada a derrota na Câmara, ainda haja uma pressão do bolsonarismo sobre o Senado. E isso se dá pelo fato de que, desde 2015, tramita na Casa um texto de reforma política já aprovado pela Câmara e que, em linhas gerais, institui também a emissão de comprovante impresso na urna de votação. Essa pressão já poderia estar sendo feita, mas o foco até aqui ficou na Câmara justamente pelo fato de que no Senado a situação do governo é ainda mais complicada. O próprio presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM), já avisou que a proposta não passa entre os senadores. Além do mais, com a composição atual da Câmara rejeitando o voto com impressão, fica bem mais difícil defender a tese de que o Senado deve votar uma proposta por lá aprovada em legislatura anterior. Se o negócio ficasse apenas na comissão, sem o plenário, ainda haveria margem para alguma argumentação.

Liquidada a fatura, com o voto com impressão enterrado para 2022, líderes políticos e membros do Judiciário já negociam alguma mudança menos relevante que deixe o presidente com algum argumento junto ao seu eleitorado. Entre essas medidas estariam a ampliação do número de urnas que passariam pelo chamado teste de integridade. Eles esperam que, com isso, Bolsonaro possa argumentar com seus aliados que não saiu da disputa com uma derrota completa e que conseguiu avanços no sistema. Isso, esperam os articuladores, contribuiria com a redução das tensões entre o presidente e os demais Poderes. Não dá para contar, porém, que Bolsonaro seguirá a lógica do acordo dessa vez. Ele nunca seguiu.

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