Política em Análise

No Jornal Nacional, Lula mira na classe média

Ex-presidente tenta fazer discurso mais ao centro para reduzir a rejeição e buscar indecisos, e escorrega em fala sobre o agronegócio

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 26 de agosto de 2022 | 09:32
 
 
 
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Na sabatina realizada pelo Jornal Nacional na noite de quinta-feira (25), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixou bem nítida uma estratégia de focar no eleitor de classe média, indeciso, esforçando-se para tentar reduzir a rejeição do PT. No geral, foi bem e aproveitou as oportunidades e deixou até mesmo a campanha bolsonarista preocupada. Claro que também cometeu erros, estava muito nervoso na primeira parte e deixou escapar frases e interpretações que também serão exploradas pelos adversários. Mas para quem está em primeiro nas pesquisas não há muito do que reclamar.

Foram dois Lulas no JN. Nos primeiros 15 a 20 minutos da entrevista, ele estava visivelmente desconfortável. No esperado debate sobre corrupção, falou alto, chegando pra frente na cadeira, sem sorrisos, indicando certa raiva, como em um confronto e não em uma conversa. Mas se na forma não foi adequado, no conteúdo acabou se saindo bem nessa parte, em sua estratégia, ao driblar o tema corrupção ao admitir que houve de fato desvios mas que eles só apareceram pois os petistas não bloqueavam as investigações.

Do meio para frente, entrou em ação o Lula mais conhecido, que tem um discurso suave para seduzir o eleitorado e que transforma tudo em uma conversa de bar. Falou de futebol, churrasquinho, cerveja, chamou Wiliam Bonner e Renata Vasconcellos para o papo quase que conduzindo os temas. E aí, de tão à vontade, acabou escorregando em um tema que os adversários certamente vão explorar: a visão sobre o agronegócio. Em um primeiro momento, indicou que quem trabalha no campo é refratário ao meio ambiente. Quando Renata reagiu à generalização, percebeu e tentou fazer uma emenda separando agricultores familiares e médios produtores de alguns empresários de grandes empresas do agronegócio, mas ainda assim saiu mal. Falou de armas no campo e disse que o MST fazia um favor a certos fazendeiros ao invadir terras, o que certamente afasta ainda mais esse público.

Durante toda a entrevista, ficou nítido que Lula não foi para o JN falar com os mais pobres, mas com a classe média. O foco era diminuir a rejeição do PT para tentar estancar um crescimento das intenções de voto de Bolsonaro nesse público, tentar atrair indecisos e eleitores dos demais candidatos da terceira via. A frase sobre o MST não ajuda, mas outras sim. Ao admitir a corrupção investigada pela Lava Jato, ainda que criticasse a operação e ao reconhecer que o governo Dilma cometeu erros na política econômica, por exemplo, Lula tentou falar com um eleitor que o levou ao Palácio do Planalto mas depois esteve nas ruas para derrubar a ex-presidente. A narrativa de que houve um golpe, costumeiramente usada, esteve longe do discurso. Nessa linha, a grande estrela de suas falas foi Geraldo Alckmin, citado a todo instante como exemplo de que sua candidatura representa a união, que não é da esquerda, mas do centro. Que quem não é PT  e não é Bolsonaro deveria, assim mesmo, ser Lula.

No fim, ministros, filhos e aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) foram às redes reclamar dos entrevistadores, dizendo que parecia um horário eleitoral ou uma chá das cinco. A primeira reação não foi criticar falas de Lula, mas dizer que ele estava à vontade demais. De certa forma, isso indica que, para eles, o petista se deu bem na entrevista. E de fato, para quem está na frente das pesquisas e só necessitava mesmo de um empate, Lula saiu-se até melhor do precisava. Após a participação dos três primeiros colocados nas pesquisas (faltando ainda Simone Tebet, que fala hoje), sabe-se que da bancada do Jornal Nacional não sairá nenhuma mudança no cenário eleitoral. Aos que tentam tirar Lula da liderança restarão eventuais efeitos secundários da melhora do cenário econômico e do horário eleitoral. No telejornal de maior audiência da TV brasileira ele deixou claro qual será sua arma para combater essas estratégias nas Eleições 2022. Um discurso mais ao centro  e uma aposta na redução da rejeição.

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