Política em Análise

O Supremo governa

Assuntos mais importantes do país acabam decididos por 11 ministros, sem voto, por falta de ação do Legislativo, atropelo de regras pelo Executivo e judicialização por parte da oposição

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 13 de abril de 2021 | 10:37
 
 
 
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Praticamente tudo o que de relevante acontece hoje na política brasileira está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). Das iniciativas relacionadas ao combate à pandemia, como compra e autorização de vacinas e instalação de CPI da Covid, a decretos ambientais e de regulação de armas, passando, claro, pelo debate eleitoral de 2022 representado pelos processos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Onze pessoas, indicadas por representantes da população, mas não votadas diretamente, decidem hoje o futuro do Brasil. Evidente recado de que o país não vai bem.

São vários os motivos que levam o Supremo a ser cada vez mais atuante nas questões centrais do país. No entanto, em resumo, essa atuação ampla, e por vezes exagerada, se dá por três fatores: desrespeito às regras por parte do Executivo, ausência de ação do Legislativo e judicialização promovida pelas oposições, que não têm força política para fazer valer sua vontade e usam o Judiciário para fazer o que não conseguem no Congresso.

O caso da CPI da Covid é bem exemplificativo. Como já disse aqui, considero interferência indevida do Poder Judiciário no Legislativo a determinação para que o presidente do Senado instalasse a comissão. Acho mesmo que é assunto interno do Senado e que deveria ser resolvido com pressão política por parte da oposição dentro da Casa, seja obstruindo pautas ou comissões para fazer valer a vontade dos que exigem que o colegiado seja instalado. O STF, porém, já entendeu por diversas vezes que não há cabimento para juízo de conveniência por parte do presidente do Senado. Assim, decidiu novamente por meter a colher no assunto por conta da paralisia no Legislativo.

Da mesma forma, foram ao STF pedidos para que Rodrigo Pacheco aceitasse abrir um processo de impeachment contra ministros da própria Corte, ou para que o comando da Câmara, hoje com Arthur Lira, aceitasse um pedido de impedimento de Jair Bolsonaro. E com frequência são discutidos temas internos das duas Casas ou mesmo assuntos que são de atribuição do Legislativo por vezes atropelados pelo Executivo. O caso do decreto das armas, cujos trechos foram derrubados pela ministra Rosa Weber ontem também nos trazem esse exemplo. O assunto deveria ter sido discutido no Congresso, foi usurpado pelo presidente sem que o Parlamento nada fizesse, mesmo podendo derrubar o decreto, e agora precisou de uma canetada de ministro do Supremo.

Todas essas situações indicam que a classe política brasileira perdeu a capacidade de dialogar. Câmara e Senado não conseguem resolver seus problemas sozinhos. O Executivo, como eu já disse, é uma usina de novos problemas. Sobra ao Judiciário a tarefa de agir por eles. Assim, aos poucos, fomos nos acostumando com o STF governando, o que não é normal.

Já basta termos que ver o futuro do país sendo discutido por meio dos processos penais que chegam na Corte. Assim será amanhã, ou nos próximos dias, quando o plenário voltará a debater a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba nos processos de Lula, o que pode ter impacto na disputa de 2022. Assim será também, muito provavelmente, caso se configure a esdrúxula ideia de tirar o presidente e o vice do país para que o Orçamento seja sancionado por Arthur Lira, livrando Bolsonaro de mais um crime de responsabilidade. Como Lira é réu no Supremo, a Corte teria que rediscutir se ele pode ou não assumir a linha sucessória do país. Ou seja: nesse caso, até o presidente seria decidido pelo Supremo. Em qual lugar do mundo democrático isso é normal?

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