Política em Análise

Pazuello faz o combinado

Ex-ministro assume toda a culpa e livra o presidente de responsabilidade em seu depoimento na CPI

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 20 de maio de 2021 | 10:51
 
 
 
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No primeiro dia de depoimento na CPI da Covid-19, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello cumpriu exatamente o combinado e o esperado pelo governo federal e, em especial, pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ele assumiu a responsabilidade por todas as ações do Ministério da Saúde durante o combate à pandemia da Covid-19 e negou que tenha recebido qualquer interferência do chefe do Executivo para agir de um jeito ou de outro na questão.

Embora seja fato que o ex-ministro da Saúde mente a esse respeito, afinal o próprio presidente e ele próprio já tenha dito, publicamente, que um mandava e o outro obedecia, o fato é que o conteúdo do depoimento acabou sendo favorável ao discurso que a base aliada do Planalto quer fazer prevalecer. Afinal, se ao fim dos trabalhos houver qualquer indicativo de irregularidade, ela estará toda nas costas do general do Exército e não do presidente da República.

A fidelidade de Pazuello a Bolsonaro foi bastante trabalhada pelo Palácio do Planalto. Por isso, ele recebeu apoio da Advocacia Geral da União (AGU) para conseguir um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF), teve cargos oferecidos no governo e chegou à comissão escoltado pelo senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente. Ao assumir as responsabilidades sobre a gestão na Saúde, ele também conta que, futuramente, pode ter o apoio do governo para diminuir consequências no âmbito jurídico. Por isso, segue o combinado.

Para cumprir o acordo, porém, ele precisou mentir repetidas vezes. No caso mais flagrante, afirmou que Bolsonaro não o desautorizou em nenhuma hipótese, quando na verdade o próprio presidente afirmou publicamente que estava mandando cancelar uma compra de Coronavac autorizada por Pazuello. Se o depoente não estiver mentindo, então é Bolsonaro quem mentiu à imprensa ao dizer que a decisão de cancelar a compra era dele. Não tem como os dois estarem falando a verdade ao mesmo tempo. Ou o que o presidente fala não se escreve?

Independentemente de ter falado a verdade ou a mentira na CPI, Eduardo Pazuello está dentro do seu direito. Como já enfatizei em coluna no jornal O TEMPO, embora oficialmente testemunha, o general é na verdade o principal investigado na CPI. Como acusado, pode mentir sem sofrer qualquer punição especificamente sobre isso. Ninguém é obrigado a confessar. E a responsabilidade de desmascará-lo é dos senadores, que se mostraram muito despreparados para tal no primeiro dia de depoimento. Internautas que acompanhavam a CPI estavam sabendo mais do que os inquiridores. Com isso, Pazuello reinou tranquilo no primeiro dia. Ainda assim, Pazuello sabe que, ao fim e ao cabo das investigações, será responsabilizado. Agarra-se ao apoio do Planalto que, no fim, será o que muito provavelmente, um dia, o levará para a cadeia.

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