Política em Análise

Polarização também muda a cara do Congresso

Centro fica menor sobretudo no Senado e diálogo se torna mais difícil com fortalecimento de bancadas mais vinculadas a Bolsonaro e Lula

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 03 de outubro de 2022 | 11:38
 
 
 
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A polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), contribuiu com uma mudança na cara do Congresso Nacional, que ficou mais claramente definido. Junto com um aumento do grupo de partidos conservadores, vieram uma variação não tão grande no tamanho da oposição e o enfraquecimento de partidos de centro. Além disso, legendas que apenas orbitavam em torno de PL e PT perderam fôlego.

Antes, uma observação: a coluna baseia-se em dados do Diap, calculados com os resultados de momento, ainda incompletos, já que alguns Estados têm apuração em andamento. Exatamente por causa disso, há ainda possibilidade de modificação dos dados dos tamanhos das bancadas. 

Desde ontem, percebe-se muita gente impressionada com o forte crescimento do PL, impulsionado pelo presidente. De fato, passar dos 68 para 99 deputados é um grande feito. Mas parte desses 31 deputados a mais foram obtidos canibalizando aliados, como o PP, que perdeu 11 deputados, além de Republicanos, PTB e PSC, que perderam dois deputados cada um, e o Patriota, que encolheu uma cadeira. Somados aos cinco nomes perdidos pelo Novo, que frequentemente vota com o presidente e que tinha uma bancada mais alinhada com o Planalto, foram 23 parlamentares perdidos pelos aliados. Assim, o crescimento desses partidos mais vinculados ao presidente foi, de fato, de oito cadeiras.

Enquanto isso, a Federação PT, PCdoB e PV cresceu de 76 para 79. O crescimento se deu em detrimento de aliados que ficaram de fora da federação. Principalmente o PSB, que perdeu 10 parlamentares. O PDT, que optou por caminho solitário com Ciro Gomes, teve dois deputados a menos. A Federação PSOL/Rede ganhou quatro nomes, diminuindo o prejuízo da oposição. No fim, partidos mais diretamente ligados à esquerda ficaram com cinco cadeiras a menos. Os demais partidos na Câmara perderam 3, sendo ajudados pelo crescimento do União Brasil de 51 para 59 deputados, e sendo atrapalhados pela forte queda do PSDB, de 29 para 18 cadeiras.

O crescimento, embora em proporções distintas, de PL e da federação do PT indica que os votos nos números de Lula e Bolsonaro, de cabo a rabo, nas urnas pesaram favoravelmente para impulsionar as duas legendas e arrasar seus aliados, o que reforça a tese da polarização em torno das figuras de Lula e Bolsonaro.

A comprovação de que estamos diante de um cenário em que o centro continua diminuindo e que o diálogo entre as forças políticas fica ainda mais difícil se dá quando olhamos os números dos demais partidos que compõem o quadro partidário na Câmara e também no Senado. Nas eleições de 2022 para esta última Casa, tivemos um resultado expressivo dos partidos que apoiam o presidente. De 19 cadeiras, PL, PP, Republicanos, PSC e PTB passam a ter 24. O crescimento veio mesmo com o encolhimento de PP e PTB. Enquanto isso, na esquerda, PT, PDT, Rede e PSB, juntos, passaram de 12 para 13 nomes, com o PT ganhando duas cadeiras e o PDT perdendo uma.

Como se pode notar, se os dois lados cresceram, a perda só pode ter se dado no grupo que ficou em cima do muro, fechando com a terceira via ou fazendo apoios mais estanques, de última hora. Assim, União, MDB, PSD, Podemos, PSDB, Cidadania, PROS e a bancada do sem partido ficou com seis cadeiras a menos no Senado.

Dados todos os números, é preciso alguma cautela para dizer que o bolsonarismo se fortalece demais na Câmara ou que Lula terá uma situação de ingovernabilidade caso seja eleito. Dentro desse grande grupo eleito no PL e em partidos aliados, também estão nomes que estão históricamente mais ao centro e que se moveram apenas para aproveitar a polarização. Podem aceitar negociações com qualquer governo que se eleja. Isso depende da análise de nome a nome e da interpretação dos primeiros movimentos de cada um deles após o resultado do segundo turno. No Senado, porém, não há dúvidas de que o conservadorismo cresceu a olhos vistos, com um reforço do cenário que já ganhava corpo nos outros dois terços do Senado renovado há quatro anos. Por isso o Senado fica mais parecido com a Câmara, o que não se viu na última Legislatura. A mudança que a Casa dos Deputados experimentou em 2018 o Senado só completou agora. E uma primeira consequência tende a se dar na situação de Rodrigo Pacheco (DEM-MG), na busca por se reeleger. Não será fácil, mas esse é assunto para outra coluna.

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