Política em Análise

Por que Bolsonaro fez acordo com o Congresso?

Presidente pensou nos filhos e nos riscos de uma represália nas reformas administrativa e tributária

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 04 de março de 2020 | 09:24
 
 
 
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Grupos bolsonaristas se mobilizaram para grandes atos no dia 15 contra o Congresso Nacional e a favor do governo. No entanto, acabaram atropelados por um acordo que o presidente Jair Bolsonaro acabou fazendo com as Casas Legislativas. O curioso, para muita gente, foi o fato de que o acordo veio justamente no momento em que a vitória de Bolsonaro na manutenção dos vetos era iminente. E aí, tem quem tenha ficado se perguntando: por qual razão o presidente deu os braços ao Congresso e aceitou dividir os R$ 30 bilhões do Orçamento - R$ 15 bilhões voltam para o Executivo e os outros R$ 15 bilhões vão seguir nas mãos do Parlamento - justamente quando parecida mais forte?

A explicação passa por dois pontos: há pautas mais perigosas para o governo no futuro e a família do presidente tem um telhado de vidro pronto para ser quebrado.

Bolsonaro sabia que, se batesse o pé, como ameaçou inicialmente, conseguiria manter os vetos, pois grande parte do Senado, incluindo parlamentares independentes e até mesmo da oposição, achavam um exagero dar R$ 30 bilhões para o controle do Legislativo. E como a derrubada de vetos depende de maioria separadamente nas duas Casas, mesmo que deputados resolvessem esticar a corda, o veto seria mantido.

Mas, aconselhado por assessores, Bolsonaro pensou lá frente. Primeiro, nas ameaças a seus filhos, que estão encrencados na Justiça ou nos Conselhos de Ética. No caso de Eduardo, o deputado, há um processo de cassação em curso e, não por acaso, a análise sobre o parecer de seu processo foi adiada para esta quarta-feira. Em meio a uma briga intensa com o PSL, que apresentou o pedido de cassação, e famoso por declarações polêmicas, inclusive contra o Parlamento, Eduardo Bolsonaro correria um risco enorme de ser mandado para casa se o presidente resolvesse ir para o tudo ou nada com o Congresso. O mesmo vale para Flávio Bolsonaro, que embora goze de prestígio junto a senadores por uma posição mais ponderada, não pode nem pensar na hipótese de perder o cargo de parlamentar, sob o risco de parar na prisão dias depois em uma ação do Ministério Público do Rio de Janeiro.

Além dos riscos para os filhos, Bolsonaro também temia que, insatisfeita com a falta de um acordo, a Câmara acabasse também prejudicando as pretensões do governo nas reformas tributária e administrativa. Essas trazem muito mais riscos futuros ao governo do que uma mera batalha orçamentária, que valeria para este ano e poderia ser revista no ano seguinte.

No discurso a seus apoiadores, Bolsonaro age como se fosse antagonista do Congresso. Na prática, descobriu que não é assim que a banda toca.

 

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