Política em Análise

Sinuca para conservadores nas redes

Migração para redes sociais alternativas alija o grupo do debate se o restante dos internautas ficar onde está

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 14 de janeiro de 2021 | 11:13
 
 
 
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Políticos de direita e seus apoiadores começaram nos últimos dias uma migração das redes sociais mais famosas para outras plataformas e prometem para amanhã um protesto sem postagens, curtidas ou comentários em redes como Twitter, Facebook ou Youtube. O objetivo é pressionar contra o que chamam de censura, após Donald Trump e perfis radicais ligados ao QAnon serem banidos das redes em razão de incentivarem uma conspiração que culminou com a invasão do Capitólio, sede do Congresso norte-americano.

Inicialmente, esses grupos passaram a incentivar uma migração em massa de eleitores conservadores para a plataforma Parler, que tem regras menos rígidas para o combate a crimes de ódio e que, por isso, foi também banida das lojas do Google e da Apple e retirada dos servidores da Amazon. Isso tornou praticamente inviável a continuidade das atividades na rede. Após a suspensão do Parler, a nova estratégia é a de criar perfis no Telegram. Nos últimos dias, políticos como o presidente Jair Bolsonaro e diversos deputados que apoiam o governo fizeram uma campanha para a migração à rede de envio de mensagens que concorre com o WhatsApp.

Ocorre que se apenas as pessoas desse grupo migrarem para o Telegram e o restante dos usuários continuar nas outras redes, muito mais amplas, os conservadores correm grande risco de ficarem falando sozinho. Pregar para convertidos, apenas trocando impressões parecidas pode alijar essa ala da direita do debate público. Não resolve nada boicotar Twitter, Youtube, Facebook ou WhatsApp e não ser ouvido por ninguém que possa ser convencido a mudar de lado.

Os impactos não serão sentidos apenas para a direita, mas para todo o debate político. A divisão dos espectros em duas redes tende a ampliar a polarização, com a incapacidade total de que os dois grupos dialoguem. Isso é certamente danoso à sociedade e as consequências tendem a ser o aumento do ódio e o desrespeito à divergência quando o debate for possível.

Na luta para promover uma migração ao Telegram, a direita aproveitou-se e foi ajudada por uma mobilização de muitos internautas nos últimos dias contra as novas regras de privacidade do WhatsApp, que obrigam o internauta a aceitar um compartilhamento de dados com o Facebook. Por causa dessa regra, que impede que qualquer cidadão acesse o WhatsApp a partir do dia 8 de fevereiro caso não aceite a mudança, o número de downloads do Telegram nos últimos dias disparou. O mesmo se deu em relação ao Signal. Se esse movimento se acelerar, pode ser que o Telegram entre no radar das pessoas comuns, permitindo que os conservadores consigam de fato ignorar as atuais redes. Por enquanto, o que parece é que trumpistas e bolsonaristas, em especial, ficaram numa sinuca de bico, em uma guerra difícil de vencer.

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