É inegável que o envelhecimento da população torna incontornável que se faça no Brasil uma reforma da Previdência. Mesmo a oposição sabe disso. O discurso radical na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) serve ao jogo político, mas até os governadores de esquerda estão igualmente compelidos a rezar por sua aprovação.
Isso, claro, não impede que se debata o potencial da reforma e, consequentemente, se o tipo de remédio escolhido para debelar o problema crônico das contas do setor é o correto. A imprensa tem feito seu papel para tentar decifrar o que a reforma representa, mas esbarra, às vezes, na falta de transparência justamente daqueles que deveriam estar preocupados em mostrar para o cidadão a sua importância.
O governo gasta um bom dinheiro com publicidade da reforma, mas, hoje, recusa-se a fornecer ao cidadão e aos parlamentares que vão analisar a proposta dados que são fundamentais para que se meçam os efeitos da reforma.
Em 4 de abril, por exemplo, um cidadão solicitou ao Ministério da Economia o acesso ao relatório de análise de impacto regulatório elaborado pelo órgão e o parecer jurídico da Procuradoria Geral de Fazenda Nacional sobre a reforma da Previdência. A partir dos dois documentos seria possível ter uma noção mais clara do que o governo espera de consequências da reforma. O acesso foi negado com a seguinte explicação: “Registra-se que se trata de matéria com alta sensibilidade política e econômica, na qual a divulgação prematura ou assimétrica de informações pode afetar inclusive os mercados. Portanto, entende-se que neste momento os documentos devem ser mantidos como de acesso restrito. A antecipação de documentos, dados e informações antes que se inicie a discussão de mérito da proposta no Congresso Nacional pode trazer prejuízos à sua tramitação, por interpretações equivocadas ou utilização inadequada, em prejuízo do interesse público envolvido”. Oras, o prejuízo à tramitação é justamente discutir a proposta sem dados técnicos suficientes que a embasem.
Um dia depois, outro pedido de cidadão solicitava a disponibilização dos cálculos que projetaram uma economia estimada de R$ 1 trilhão com a reforma. O número é frequentemente utilizado pela equipe econômica e pelo ministro Paulo Guedes. Mais uma vez, o governo se recusou a divulgar os dados.
Em fevereiro, um jornalista já havia pedido ao Ministério da Economia os dados da tramitação da proposta na pasta, constando cálculos e correspondências oficiais trocadas pelos órgãos envolvidos. Foi informado de que os documentos foram classificados como restritos por serem documentos preparatórios.
Na última semana, o ministro da Economia informou que o país poderá crescer 6% ao ano assim que a reforma for aprovada. Que se isso se der até o meio do ano, já ocorreria um crescimento de 3% no segundo semestre. Se esse dado é divulgado, por qual motivo o governo não pode demonstrar como chegou a essa conclusão?
É preciso que o Executivo entenda que hoje, apesar de a rejeição à proposta ser bem menor na sociedade, a aprovação ainda é difícil. Nas conversas com deputados, vê-se que a maioria rejeita a maior parte dos pontos mais nevrálgicos da proposta. Ser transparente poderia virar esse jogo ou servir para a correção de erros eventualmente cometidos na produção da proposta.
Transparência para virar o jogo
É preciso que o Executivo entenda que hoje, apesar de a rejeição à proposta da reforma da Previdência ser bem menor na sociedade, a aprovação ainda é difícil
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