Política em Análise

Trapalhadas do governo diante da CPI

Aliados do governo dão munição aos oposicionistas e pioram a situação do Executivo no colegiado com atitudes e falas fora de propósito

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 28 de abril de 2021 | 11:34
 
 
 
normal

Quem acompanha sempre esse espaço sabe que eu não acredito que a CPI trará à baila assuntos mais graves em relação ao comportamento do Executivo federal no combate à pandemia do que os que já estão aí públicos. No entanto, a postura do governo ao lidar com o tema, logo no início dos trabalhos, mostra que a dor de cabeça para o Palácio do Planalto tende a ser maior do que inicialmente prevista. O governo começou a CPI com o pé esquerdo e dando bastante munição aos oposicionistas e independentes, que indicam disposição de trucidar o Executivo nos próximos 90 dias.

As trapalhadas do governo começaram ainda antes do colegiado se reunir pela primeira vez. Foi quando vazou para o público um relatório da Casa Civil indicando 23 possíveis erros do governo no combate à pandemia. É chocante perceber que o governo conseguiu elencar mais problemas do que a oposição, que apontou 18 falhas. Assim, o relatório feito pelo próprio governo servirá como roteiro para que a CPI possa investigar os problemas no combate à pandemia.

Do chefe da própria Casa Civil, Luiz Ramos, surgiu também mais uma munição para os oposicionistas. Em reunião que não sabia que estava sendo transmitida, ele confessou que tomou escondido a vacina da Covid-19, para não desagradar o presidente, indicando que Bolsonaro continua sendo contrário à vacinação. Além disso, afirmou que estava tentando convencer o presidente a se vacinar. Isso certamente será levado à CPI e, muito provavelmente, o ministro será chamado a dar declarações aos senadores mais adiante.

Quem também pode ser chamado, cedo ou tarde, é o ministro da Economia, Paulo Guedes, que, na mesma reunião, afirmou que os chineses criaram o vírus e, mesmo assim, os norte-americanos possuem uma vacina melhor do que a deles. A declaração, que desgasta a relação com a China, origem dos insumos que utilizamos para a produção de vacinas no Brasil, pegou muito mal. O presidente da CPI da Covid-19, Omar Aziz, que se dizia contrário à convocação de Guedes, afirmou que ele precisava falar menos.

Na reunião da CPI, as falas de parlamentares governistas, pouco experientes no debate em comissões de inquérito, tampouco ajudaram. Marcos Rogério, por exemplo, ao defender que o comando da comissão precisava ser isento, afirmou que parte da população considera Bolsonaro um genocida. Flavio Bolsonaro reclamou que a comissão não deveria ser presencial, por conta dos riscos para os senadores, o que levantou a bola para que o relator dos trabalhos, Renan Calheiros (MDB-AL) lembrasse as várias vezes que o presidente e sua família foram contrários ao isolamento. O próprio Flavio fazia parte da comissão com uma tipoia no braço, após se acidentar em uma viagem de férias ao Ceará.

Aliás, a relação que o governo conseguiu construir com o relator Renan Calheiros é a pior possível. Mesmo com remotas chances de conseguir tirá-lo da função, a base aliada, representada pela deputada Carla Zambelli (PSL-SP), tentou entrar na Justiça contra ele. Além de não obter êxito, ainda conseguiu irritar ainda mais Renan, que fez um discurso duro contra o governo no primeiro dia da comissão e vai comandar os trabalhos com sangue nos olhos contra Bolsonaro e sua turma. Agora, senadores governistas vão ao STF com o mesmo objetivo: tirar Renan do páreo. O que mais o governo fará para se encrencar ainda mais na CPI?

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!