Retrospecto

STJ já anulou duas operações de grande impacto no passado

Satiagraha e Castelo de Areia foram alvos de questionamento e acabaram terminando em pizza

Por Léo Simonini
Publicado em 16 de junho de 2019 | 03:00
 
 
 
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Embora seja a maior já realizada quando analisado o número de fases, denunciados e condenados, a operação Lava Jato não é a primeira de grande porte no país. Outras duas da década passada, Satiagraha e Castelo de Areia, tiveram grande relevância em sua época e tomaram conta do noticiário. Nos dois casos, porém, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou que houve erros processuais ao longo do trabalho e, por isso, decidiu por anulá-las totalmente. Isso permitiu que acusados de crimes permanecessem livres do alcance da lei.

Agora, os vazamentos das supostas conversas entre o ministro Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, algumas já confirmadas por eles, trouxe o debate sobre a anulação de processos.

Satiagraha

Deflagrada em 8 de julho de 2008, a operação foi comandada pelo ex-delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz e contou com a participação de 300 policiais. Eles cumpriram 24 mandados de prisão e 56 de busca e apreensão nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Salvador. Foram presos Daniel Dantas, sócio-fundador do Grupo Opportunity (banco); o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta; o investidor Naji Nahas; e outras 14 pessoas. Eles eram suspeitos de manter um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro.

Já no dia seguinte, o então ministro da Justiça, Tarso Genro, pediu sindicância para apurar possíveis irregularidades na operação, que permitiram um flagra da prisão de Celso Pitta ainda de pijama. No dia 9 de julho, o então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, libertou Dantas e mais dez pessoas. Tarso afirmou que a decisão foi jurídica e técnica. Uma nova prisão de Dantas foi decretada no dia seguinte, mas, na mesma data, Gilmar concedeu habeas corpus a Pitta, Nahas e mais nove pessoas. Em vão, juízes federais protestaram contra a decisão.

Após mais quatro dias, Protógenes virou problema para a cúpula da PF, por ter cometido possíveis excessos na operação. O afastamento dele do inquérito foi anunciado dois dias depois. Na época, surgiram suspeitas de que as escutas telefônicas dos acusados teriam sido feitas com orientação do então diretor geral da Agência Nacional de Inteligência (Abin), Paulo Lacerda, mas a agência negou que tenha participado da Satiagraha.

A operação ainda foi criticada pelo presidente do STF, pelo fato de a prisão dos investigados, surpreendidos em suas casas na madrugada, ter sido mostrada na TV. Gilmar classificou a ação da PF como “espetacularização” também pelo uso de algemas nos presos.

Fim da linha

Diante das críticas que surgiam de ministros do Supremo e de defensores, o STJ acabou por anular a operação inteira em 2011. A Quinta Turma da Corte à época, seguindo voto do ministro Adilson Macabu, desembargador convocado ao tribunal, entendeu que foi ilegal o chamamento de agentes da Abin para ajudar nos grampos telefônicos que foram usados como prova no caso. De acordo com o STJ, a Abin existe para assessorar a Presidência da República, e não para auxiliar a Polícia Federal.

Depois disso, Protógenes, apesar de ter sido eleito deputado federal, acabou perdendo o cargo de delegado, acusado de quebra de sigilo funcional durante a operação, ou seja, de vazar informações. Alegando temer pela própria vida, ele pediu exílio na Suíça em 2016, onde vive desde então.

Anistia

No último mês de abril, encabeçados por Coronel Tadeu (PSL-SP), deputados do partido do presidente iniciaram articulação de um projeto de lei que conceda anistia a Protógenes Queiroz e lhe devolva o cargo de delegado federal. Com isso, ele também recuperaria os direitos políticos. A matéria ainda segue sendo costurada na Câmara dos Deputados, e a intenção é que seja votada em breve, em regime de urgência.

Castelo de Areia

Deflagrada em março de 2009, a operação Castelo de Areia, que começava a revelar ilegalidades mais tarde confirmadas pela Lava Jato, acabou derrubada com base no entendimento de que denúncias anônimas não podem servir de base exclusiva para que a Justiça autorize a quebra de sigilo de dados de qualquer espécie. Com esse entendimento, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) à época decidiu-se, em 5 de abril de 2011, pela nulidade de toda a operação.

As provas do processo se originaram da autorização da Justiça, que deu senhas para policiais federais acessarem bancos de dados de empresas telefônicas, o que foi considerado irregular. As investigações pairavam sobre a empreiteira Camargo Corrêa, suspeita de pagar propinas na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco (obra que foi alvo da Lava Jato, em 2014).

A PF também apontou irregularidades em 12 obras em São Paulo, entre elas trechos do Rodoanel, do túnel da avenida Jornalista Roberto Marinho e de trechos do metrô. Em Salvador, investigadores também viram fraudes na licitação do metrô, com a participação ainda da Andrade Gutierrez (também citada na Lava Jato) e da alemã Siemens.

Planilhas apreendidas pelos agentes na época traziam a indicação de pagamentos a políticos de sete partidos: PPS, PSB, PDT, DEM, PP, PMDB e PSDB. A suspeita da PF era que se tratava de propina em troca dos contratos e doação ilegal para campanhas.

Em razão da anulação da Castelo de Areia, a Justiça Federal de São Paulo determinou, em 10 de agosto de 2017, que as provas levantadas na operação fossem destruídas. Mas o juiz federal Diego Paes Moreira, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, suspendeu o descarte, atendendo pedido da Procuradoria da República em São Paulo, que acredita que o material poderá ser novamente analisado.

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