Medicina

O que é aconselhamento genético e como ele ajuda a tratar doenças hereditárias

Famosos, como Angelina Jolie e Chris Hemsworth, e anônimos têm recorrido ao processo que detecta a possível ocorrência de um transtorno que pode ser passado de geração em geração


Publicado em 17 de julho de 2023 | 06:37
 
 
 
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Em 2013, Angelina Jolie retirou os dois seios em uma dupla mastectomia preventiva. Na época, os médicos disseram que a atriz tinha 87% de chances de desenvolver câncer de mama e 50% de ter câncer no ovário. Também de forma preventiva, a estrela de Hollywood retirou, em 2015, os ovários e as tubas uterinas para prevenir o surgimento de possíveis tumores. Naquela época, Angelina Jolie já havia perdido a mãe, Marcheline Bertrand, a avó e uma tia para o câncer.

“Quando soube que essa era minha realidade, decidi ser proativa e minimizar o risco o quanto podia”, ela escreveu em um artigo publicado no ‘The New York Times’. Com receio de acompanhar o histórico da família, a artista decidiu passar pelas cirurgias após fazer um exame de sequenciamento genético, que acabou detectando uma mutação no gene BRCA1. Mudanças hereditárias no material, genético especificamente em BRCA1 e BRCA2, aumentam o risco de câncer – o caso de Jolie – e o aparecimento de tumor na mama e no ovário em pessoas mais jovens do que aquelas que não apresentam essas mutações.

Jolie, no entanto, só soube de sua condição porque realizou um aconselhamento genético, processo pelo qual se fornecem informações a um paciente ou a uma família a respeito de uma doença genética – o câncer, por exemplo, na família de Jolie – que possa afetá-los. Com o processo, o objetivo é que a pessoa tenha conhecimento de certas predisposições e possa tomar decisões sobre sua saúde.

Em outras palavras, “é um procedimento médico que lida com pacientes com transtornos hereditários, que podem ser passados de geração em geração”, diz o médico geneticista Henrique Galvão, médico geneticista e gerente da Dasa Genômica, representada em Belo Horizonte pelos laboratórios Lustosa e São Marcos.

O ator Chris Hemsworth, famoso por interpretar o personagem Thor nos filmes da Marvel, também recorreu aos testes genéticos para se prevenir de indesejáveis surpresas. Em novembro do ano passado, ele revelou, depois de passar por um exame, ter predisposição ao desenvolvimento da doença de Alzheimer. Com o resultado, disse que daria uma pausa na carreira para se dedicar mais à família.

Há inúmeras situações em que o aconselhamento genético deve ser oferecido, como para a descoberta de doenças como epidermólise bolhosa, atrofia muscular espinhal e predisposição ao câncer, elenca Henrique Galvão. Segundo o especialista, cada vez mais o público-alvo da investigação genética vem se expandindo, e a evolução tecnológica permite o acesso a métodos que facilitam o próprio diagnóstico e o acompanhamento de síndromes. A triagem neonatal por técnica molecular, que complementa o teste do pezinho, já é uma realidade quando o assunto é o recurso adicional que auxilia no diagnóstico de doenças genéticas.

“Tenho visto um aumento da procura do aconselhamento genético no Brasil, principalmente nos últimos dez anos por influência da Angelina Jolie, pelo que a gente vê nas mídias e também devido ao aumento na disponibilidade de informação e de pessoas com doenças raras divulgando seus diagnósticos”, observa Henrique Galvão. Dependendo da abrangência e do objetivo, o teste genético pode custar de R$ 1.000 a R$ 20 mil. Em alguns casos, os planos de saúde são obrigados a cobrir o custo.

Médica geneticista do Laboratório DLE, do Grupo Fleury, Betânia Loures também lista outros exemplos em que o aconselhamento genético é indicado: quando um casal deseja conhecer a possibilidade de ter algum problema de saúde para seus futuros filhos; quando um casal já tem um filho afetado com uma condição congênita ou genética e deseja conhecer a possibilidade de acontecer novamente; e quando existe parentesco entre o casal.

“O importante é que o aconselhamento genético é abrangente, e por meio dele o médico não só fala sobre o risco de recorrência, mas também sobre medidas preventivas para uma gestação saudável. E, no caso de já existir uma condição genética, são explicados o quadro clínico, possíveis complicações, prognóstico da condição e melhor tratamento a seguir”, avalia Betânia.

A especialista faz uma importante diferenciação entre aconselhamento genético e exame de diagnóstico genético: “O AG é uma consulta médica, sendo o diagnóstico genético, realizado por meio de exame clínico e testes genéticos, uma parte dessa consulta”.

Questão multidisciplinar

Apresentado o diagnóstico, a exemplo do que ocorreu com Angelina Jolie e Chris Hemsworth, há um acompanhamento multidisciplinar no tratamento da doença, etapa fundamental que envolve médicos de especialidades distintas – neurologistas, oncologistas, neuropediatras, geneticistas, psiquiatras, dentre outros, e psicólogos, além da presença e participação da família. “Algumas situações podem oferecer um tratamento mais rigoroso. Questões comportamentais, mudanças de hábitos e planejamento de vida tendo as informações sobre os transtornos fazem parte desse processo”, pontua o médico geneticista Henrique Galvão.

Para a médica geneticista do Laboratório DLE, do Grupo Fleury, Márcia Ribeiro, são muitos os desafios a partir da descoberta do diagnóstico. O mais importante, ela diz, é informar, confortar a família e dar condições para o melhor tratamento e acompanhamento, frequentemente realizado por uma equipe multidisciplinar.

“Felizmente, em algumas condições genéticas, temos tratamento específico, como terapia gênica e reposição de enzimas. Não significam a cura, mas auxiliam muito na melhora do paciente e na interação com seus familiares”, conclui Márcia.

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